A ILHA DOS ANDRÓIDES

Certa vez, um cientista especializado em robótica e informática foi incumbido de uma missão intrigante: conhecer a “Ilha dos Andróides”, uma pequena ilha situada na imensidão do Oceano Pacífico. Ninguém sabe como eles chegaram até lá, mas sabe-se que todos foram infectados por vários tipos de vírus de computador. Cada um dos vírus tinha uma denominação especial, um jeito próprio de se expressar, uma personalidade que obrigava os andróides a repetirem frases monótonas várias vezes por dia. Sabendo disso, o cientista levava consigo um arsenal de vacinas eletrônicas que ele injetaria através de uma pistola em locais específicos dos andróides.

Ao chegar à ilha, diante daquela beleza tropical, ele se deparou com um pequeno grupo de andróides que esbravejava contra ele, dizendo coisas do tipo: “você é um forasteiro”, “volte pra sua casa, seu intruso”, “não lhe queremos aqui”, “essa ilha é nossa, não lhe pertence”, etc. Para não despertar idiossincrasias desnecessárias, o cientista aproximou-se devagar e pacientemente daqueles andróides. Com um aparelho eletrônico especial que levava na mão direita, descobriu que aqueles andróides estavam com o “vírus da xenofobia” (H783B). Aplicou a vacina em todos eles, que ficaram curados.

Prosseguindo em sua missão, o cientista andou ilha adentro e, de longe, avistou o que parecia ser a sede de uma assembléia ou agremiação. De lá se ouviam gritos, xingamentos, discussões intermináveis, acusações, etc. Ao entrar naquele ambiente, deparou-se com vários andróides com a voz alterada e uma expressão pesada em suas faces metálicas. Eles trocavam acusações entre si e nunca chegavam a um consenso. O cientista foi até eles e descobriu que todos estavam com o “vírus da discórdia” (K89BX), razão pela qual nunca se entendiam. Depois de curá-los, ele saiu dali.

Após andar alguns quilômetros, ele chegou à capital daquela ilha, uma cidade confusa onde não parecia haver lei, nem ordem em canto algum. Ele se deparou com andróides de “sexos” opostos discutindo entre si. A andróide feminina tinha uma expressão muito cerrada e falava coisas do tipo: “nós, mulheres, somos superiores aos homens”, “nós vamos dominar o mundo”. Ele descobriu que ela tinha o “vírus do feminismo” (JL947). Por sua vez, o andróide masculino falava no mesmo tom de sua rival: “nós, homens, é que somos superiores às mulheres!! Somos mais fortes!!”. Descobriu-se que ele tinha o “vírus do machismo” (HDL48). Ele aplicou a vacina nos dois e foi embora dali. Após isto, o casal de andróides começa a refletir que ambos são diferentes entre si, mas não superiores um ao outro, e que cada um tem uma função específica na sociedade.

Logo adiante, encontrou-se com um andróide que só andava de peito estufado. Ele vivia dizendo assim: “sou superior a todo mundo dessa ilha!!”. Ele lhe perguntou o que é ser superior, mas o andróide não soube lhe responder e continuava a dizer que era “superior” a todo mundo. O cientista descobriu que ele tinha o “vírus da arrogância” (T84B5). Aplicou-lhe a vacina e o andróide caiu em si – viu que não passava de uma máquina estúpida e dotada de uma carcaça altamente perecível.

Logo depois, ele encontrou um andróide que repetia centenas de vezes por dia a mesma mensagem: “tenho orgulho da minha região”. O cientista perguntou-lhe para que servia aquele orgulho, mas ele não soube lhe responder. Descobriu que o andróide tinha o “vírus do orgulho nacionalista” (B4JK2). Aplicou-lhe a vacina e foi embora. A partir deste instante, o andróide passou a amar sua terra – e não ter orgulho dela. E, mais ainda, a amar ao planeta em que vive.

Logo adiante, o cientista vê um grupo de andróides orgulhosos e intolerantes. Eles viviam numa região específica da ilha. Falavam uma língua distinta e se vestiam de modo diferente aos demais habitantes da ilha. Diziam que aquela região era deles e que tinham proclamado a “independência”. O cientista foi até eles e descobriu que estavam infectados pelo “vírus do separatismo” (HB87Z). aplicou-lhes a vacina e despediu-se deles, que passaram a viver em harmonia com os outros.

Adiante, ele encontra um andróide com características peculiares. Ele usava um chapéu estranho e vestia um poncho de metal, pintado de várias cores e enfeitado com muitos penduricalhos. Ele carregava na mão direita uma cuia metálica, na qual ele bebia um líquido oleoso e esverdeado que sorvia com muito prazer. Andava pra cima e pra baixo com esta cuia na mão. Ela representava sua identidade. Descobriu que este andróide tinha o “vírus do orgulho tradicionalista” (K456G). Ele lhe aplicou a vacina, mas o andróide deu muito trabalho, porque o vírus estava impregnado há muito tempo nele. Mesmo assim, conseguiu seu intento e foi embora dali.

Havia também um outro andróide que dizia insistentemente a seguinte mensagem: “eu sou um profeta!! Eu sou um grande mestre!!”. Ele pronunciava isso sempre com as mãos e o queixo para cima. O cientista lhe falou que os grandes profetas viveram há muitos séculos no passado, mas o andróide não lhe dava ouvidos. Então o cientista descobriu que ele tinha o “vírus da mitomania” (D972Y) e aplicou-lhe a vacina.

Após isto, deparou-se com outro andróide igualmente bizarro. Ele prometia aos outros andróides a solução de todos os seus problemas através de uma “pistola mágica”, em troca de moeda eletrônica. Na verdade, esta pistola apenas injetava mais vírus nos outros andróides que passavam a repetir mecanicamente as mensagens: “estou curado!!”, “estou salvo!!”, “mudei minha vida para melhor!!”. O engraçado é que aqueles andróides continuavam na mesma situação de antes, embora acreditassem que não. O cientista descobriu que aquele andróide tinha o “vírus do charlatanismo” (Z8B47). Aplicou-lhe a vacina e foi embora dali.

Depois de algumas semanas fazendo uma intensa campanha de vacinação naquela ilha, o cientista começou a perceber algo de diferente naqueles andróides: eles começaram a se tornar mais “humanos”. Olhavam-se nos olhos uns dos outros, sorriam, ficaram cordiais entre si, alegres, espontâneos e sinceros. Ele começou a ver muitos casais de andróides em harmonia, que antes só viviam em brigas e discussões, andróides que não perdiam mais tempo em rivalidades e competições, e outros que se deram conta do tempo em que perderam por estarem infectados de todos aqueles terríveis vírus. O cientista foi embora daquela ilha com a sensação de dever cumprido; certo de que aqueles andróides deixaram de ser máquinas – e se tornaram HOMENS.