O que eu vi na Europa

Morei alguns anos na cidade mais antiga do ocidente, Cádiz. O tempo parou ali. Vi coisas que eu pensava que não existiam mais. Descrevi um pouco em versos e mandei pra meu irmão João Ézio.

João Ézio estar na Europa

Na verdade é diferente

A cultura é elevada

Educação evidente

Mas tem coisas tão antigas

Que impressiona a gente

Tem coisas que eu nem lembrava

Mas sei que já vi um dia

Perdeu-se em minha memória

Dos tempos da fantasia

E agora que eu vi de novo

Me trouxe até nostalgia

Cádiz por ser a cidade

Mais antiga do Ocidente

Conserva várias culturas

Cada uma diferente

Preservando as tradições

Daqui e do Oriente

Aqui pude ver pião

Daqueles de Pedro Gino

Que vende no meio da feira

Que tem um corpo e um pino

Aonde enrola a ponteira

Que alegra tanto um menino

Vi calça boca-de-sino

Paletó lascado atrás

E calça do pé virado

Que eu vi quando era rapaz

Calça de mescla com vinco

Que eu nem me lembrava mais

Aqui se vende na feira

Inda tropical inglês

Tem mescla Sta Isabel

Que eu só lembrei de vocês

Fazendo *forro de peito

Pra ganhar no fim do mês

Calça pegando marreca

De caqui e de casimira

Menino com um carrinho

Puxado com uma tira

Coisa antiga desse jeito

Eu só vi lá em **Tabira

Uma menina de marrafa

Vestindo saia plissada

Sapato conga nos pés

Passou toda arrebitada

Achando que é a última moda

Desfilando na calçada

Quebra-queixo e beira seca

Se vende em qualquer esquina

Camisa “voltalmundo”

“Melindrosa” pra menina

Vende fuba (não é fubá) de primeira

De farinha muito fina

“Castanha xoxa não vale”

Vi um menino gritar

O pitelo era bem grande

Fiquei só de me lembrar

De quando eu era criança

Que tempo bom de brincar!

Meninos brincam na praça

Com a pele quase nua

No inverno a tanajura

Comem frita ou comem crua

Tem até chupa-migué

Pra gente pegar na rua

Se brinca aqui de castanha

Fubica, bozó, gamão

Chimba, toca e peia-quente

Que no fim dá confusão

Se brinca até de artista

Com uma mausa na mão

Só não se diz “mãos ao alto!”

Porque a língua é diferente

Eita saudade da peste

Que deu em mim de repente

Sentei na praça chorando

Lembrando o tempo da gente

De repente eu acordei

Vi que não era verdade

Isso foi somente um sonho

Que eu penso que é da idade

Que sai lá no inconsciente

Pra nos matar de saudade

* Meu pai era alfaiate no interior e meus irmãos costuravam o forro de peito, uma peça do paletó. ** Tabira é a cidade onde nasci.

djalma marques
Enviado por djalma marques em 24/03/2006
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