Carnavais de outrora

Tere Penhabe

Dos bons carnavais de outrora,

Quanta saudade que temos!

Mas não se enganem amigos,

Porque todos nós sabemos:

- A saudade, na verdade,

É da nossa mocidade,

Que hoje todos nós perdemos.

Naqueles tempos ditosos,

A vida era maravilha,

Tudo em cima do lugar,

Retesada a panturrilha...

Hoje é um sufoco danado,

Até pra ficar parado,

Não se dança nem quadrilha.

Mas vou falar um pouquinho,

Do tempo que foi embora,

Dessa saudosa alegria,

Que não temos mais agora.

Aquela gente animada,

Bem versada e bem cantada,

Lá dos carnavais de outrora.

Conheci a tal de Aurora...

E saudade não me traz,

A mulher era um trambolho,

Feiiiia como o satanaz!

Arlequim, um beberrão,

Pierrô, um grande lambão,

Colombina, uma incapaz...

E a jardineira, meu filho,

Era triste com razão.

O puxadinho da casa,

Virou mesmo um barracão.

Sustentava meio mundo,

E um marido vagabundo,

Oh, Céus! Que desolação!

E o que dizer do Zezé?

Ah Zezé, cabra safado!

Descobriu a vida mansa,

Por isso virou viado.

Mas antes era um machão,

Um tremendo garanhão,

Só que em moleza, chegado.

E aquele outro da tristeza,

Que conquistou multidão,

Todos cantam até hoje,

O seu famoso refrão.

Manguaceiro, o disgramado,

Vivia torto, mamado,

Caído em qualquer portão.

E tinha lá uma donzela,

Que amava a bandeira branca,

Eu não quero fofocar,

Mas tenho aqui que ser franca:

- Só marido, perdeu dois,

E a dinherama depois,

Desceu junto na barranca.

O coração corintiano,

Que a gente cresceu cantando,

Não gosto nem de lembrar,

Vive até hoje esticando.

Antes pintava o cabelo,

Que virou seu pesadelo,

E peruca acabou usando

Mas ficou rico o danado,

Com aquele tal de baú,

Comprei muito, sim senhor!

Fui lá perto ver o angu.

E voltei desiludida,

Desencantada da vida,

Certa que tomei no... "copo".

Lembram do índio do apito?

Eu soube da malvadeza,

Pois em tupi-guarani,

Apito era safadeza.

E o tal índio se deu bem,

Pois não teve Seu Ninguém,

Que denunciasse a proeza.

E teve o Máscara Negra...

Ah pilantra duma figa!

Era só um trombadão,

Afanando rapariga.

Que de tostão em tostão,

Ajuntou uma coleção,

Cantando a mesma cantiga.

Cachaça nunca foi água,

Quem é que isso pensaria?

Aquilo foi só estresse,

Que ninguém confessaria.

Com certeza, estopim curto,

De João que teve surto,

Vendo bebum, a Maria.

O da rede, não se enganem,

Que nunca foi pescador,

Era só um trambiqueiro,

Sem qualquer louro ou louvor.

Tinha lá os seus biscates,

Mas devia pros mascates,

Deu até a mãe em penhor.

E o cabelo da mulata...

Ah coitada... judiação!

Alisou mal alisado,

Fez forfé no cabeção.

E já que era carnaval,

Resultado era fatal,

Foi musa da inspiração.

Mas teve um cara de pau,

Que enganou sem hesitar,

Dizendo na sua música,

Mamãe eu quero mamar.

Mas quem era, adivinha?

A mamãe, sua vizinha!

Que ele vivia a cantar.

E a tal turma do funil.

Saibam que reencarnou.

Em Santos, quando cheguei,

A turma se apresentou.

Emborquei no copo a fundo,

Quase achei o fim do mundo,

Algum santo me salvou.

E vou falar de chantagem,

De quem fez uma marchinha,

"Me dá um dinheiro aí",

Minha Santa Terezinha!

Se o gajo tirasse a roupa,

Não haveria uma louca,

Que não desse do que tinha.

O da sogra se estrepou...

Bem feito! Foi cutucar,

A onça com vara curta,

Ela o pôs pra trabalhar,

O que nunca tinha feito,

Mas não conseguiu dar jeito,

Desse fado não se furta.

A morena bossa nova,

Nem convém aqui lembrar,

Envergonhou a família,

De tanto ela se abrasar.

Dava mais do que chuchu,

Preso em cerca de bambu,

Velha e feia ainda quer dar.

E antes que esse povo todo,

Do cemita caia fora,

Venha me puxar a perna...

De fininho eu vou embora.

Esta é a hora de parar

De tanto caluniar,

Os carnavais lá de outrora.

Santos, 20.02.2009

www.amoremversoeprosa.com

http://artculturalbrasil.blogspot.com/2009/01/terepenhabe.html