Brincadeira de cordel para Lili e Raferty

Raferty, meu novo amigo,

Codinome Vagalume,

Sujeito que se presume

Não ter o rei no umbigo,

Hoje divido contigo

Estes versos de cordel,

Como se fosse um troféu,

Erguido pela amizade,

Que vai crescer na idade

Até o portão do céu.

Este pobre menstrel,

Apelidado de cula,

Primo distante de mula,

Cordelista de aluguél,

Vai colocar no papel,

Com ferrenha emoção

E entregar pro irmão,

Em verso de pé quebrado,

Todo carinho guardado,

Que coube no coração.

Portanto preste atenção

Na rima metrificada.

Tem que ser cadenciada,

Como manda a tradição

Da caatinga e do sertão:

O quarto com o primeiro,

Segue o segundo e o terceiro,

E volta a rimar no quinto.

Pra demostrar que não minto,

Faço cordel brasileiro.

Seis com sete e o derradeiro,

O oitavo com o nono...

Cada verso tem um dono

Um amante, um parceiro...

Ornando o cordel certeiro

Da escrita nordestina,

Que nem piu-piu e vagina

Concebendo um ser humano.

Enquanto Seu Herculano

Aprende mais que ensina.

Caboclo de teresina,

Capital do Piauí,

Muito amigo da Lili,

Poetisa cristilana,

Trago dentro da retina

As águas do Parnaíba,

O sol olhando de riba,

Jogando raios no chão;

Minha mãe em oração

E eu encurvando a giba.

Com o bucho de lombriga,

Os pés sobre a terra quente,

Cavaco no vão dos dentes,

Munheca pronta pra briga.

Nunca gostei de intriga,

Nunca tive preconceito;

Fosse canhoto ou direito,

Gravatado ou pé-no-chão;

Fosse xoxota ou colhão

Merecia o meu respeito.

Hoje que sou homem feito,

Fiquei metido a poeta.

Minha musa predileta,

Que trago dentro do peito,

Dorme comigo no leito

Há vinte anos ou mais,

Sem demostrar os sinais

De cansaço ou de desgosto.

Há anos, em todo agosto,

Faz-me lembrar que sou pai.

E que me ouça Adonai

O cordel que fiz pra ti,

Que foi também pra Lili,

Os dois poetas atuais,

Que vão entrar nos anais

Aqui do nosso Recanto:

Raferty vai virar santo

Tendo Lili por madrinha

Rezarão salve-rainha

E credo por todo canto.

E para meu acalanto

Vão fazer este cordel,

Abrir as portas do céu

E entoar o meu canto.

Vou ficando, por enquanto,

Com a fama de ateu,

Ora rezando pra deus

E ora pra satanás,

Descascando o ananás

Que padre Ciço colheu.

Herculano Alencar
Enviado por Herculano Alencar em 05/10/2005
Reeditado em 06/10/2005
Código do texto: T57042
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