O Calo do Aposentado

(Lelces Xavier)

Eu já fui guia de cego

Quando ainda pequenino

Não pude nem ser menino

De tão pobre que era

Sempre estive a espera

De um dia melhorar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Carreguei frete na feiras

Cortei cana e rocei mato

Meu sofrimento foi nato

Nasceu colado a mim

Cortei feixes de capim

Em troca de um jantar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Servi a minha pátria

Trajado de marinheiro

Lá eu não ganhei dinheiro

Meu soldo era merreca

Quase que fiquei careca

De tanto dar continência

Tendo como penitencia

O dever de me curvar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Puxei carroça de mão

Mexi massa pra pedreiro

Ganhei calo e não dinheiro

Em quase tudo que fiz

Não digo que sou feliz,

Mas infeliz não me acho

Embora viva por baixo

Não gosto de lamentar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Fui feirante e camelô

Motorista e cobrador

Fui vendedor de mangaio

Carregador de balaio

Fui garçom de cabaré

Fui pescador de maré

E fui vigia de bar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Fui portador de recado

carreguei água de ganho

Alimentei o meu sonho

Regado a lágrimas de dor

De lixo fui catador

Pra ganhar uns trocados

Virei-me por todo lado

Nada tenho pra desfrutar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Já trabalhei no lixão

Depois disso fui gari

Fui pescador de siri

Do seco comi preá

Do molhado aratu

Para o pão não me faltar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Vendi tudo que se vende

Jaca, manga e caju

Caranguejo, piaba e sururu

Tanajura, preá e rolinha

Pato, guiné e galinha

E não tenho onde morar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Vendedor eu fui de tudo

Amendoim, alfenim e cocada

Miudeza, coco verde e pomada

Lambedor, perfume e flanela

Milho, batata e canela

Pra na vida navegar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Emboçaram meu dinheiro

Um bando de marreteiro

A esbanjar meu suor

Já foi ruim hoje é pior

Todos esses maus feitores

Querendo ser meus tutores

É um fardo que carrego

As minhas contas no prego

Não tenho como pagar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Veja quantas coisa eu fiz

Fui coveiro, vigia e eletricista

Flanelinha, funileiro e repentista

engraxate, bodegueiro e bóia fria

Soldador de panela, balde e bacia

Biscateiro, pipoqueiro e cartomante

De tudo já fiz um monte

E continuo a me virar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Fui bonequeiro em Olinda

Isso eu sou ainda

Tangi gado no sertão

Ajudei a fazer pão

Aprendiz de sapateiro

Auxiliar de Cozinheiro

Nunca pude descansar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Foram trinta e cinco anos

Pagando tantos por cento

Na hora em que me aposento

Vem o governo e me diz

Que sou um pobre infeliz

Um peso nas suas costas

Que me paga mas não gosta

Desse dinheiro me "dar"

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Quando me sinto doente

E corro para o hospital

Todos lá me tratam mal

Jogam-me no corredor

Fico gritando de dor

Sem ter quem venha tratar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Sempre fui um cidadão

Cumpridor do meu dever

Não sei ler nem escrever

E a culpa não foi minha

Vontade bem que eu tinha

De ir à escola estudar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Por onde andei trabalhando

Paguei pra me aposentar

Agora eu vou perguntar

Quem embolsou meu dinheiro

Por que não recebo inteiro

O tanto que descontei

Eu sempre desconfiei

Tinha gente a me roubar

Trabalhei que nem um louco

O governo achou foi pouco

Leva a vida a me afanar

Tá preparando um novo assalto (reforma da previdência)

Meus cordéis estão a venda a R$ 3,00. na compra de uma coleção com dez exemplares frete grátis para todo território brasileiro.

Fones (81) 3010-6328/98881-7309

Aceito encomendas para confecção de cordéis personalizados, contando a história da sua vida ou a vida da sua empresa.