HISTÓRIAS DO CANGAÇO: A CASTRAÇÃO DE PEDRO BATATINHA

1

Mil, novecentos e trinta

Era o ano que corria.

A trupe de Lampião,

Num ato de covardia,

Lamentável, desumano,

No interior sergipano

Das suas aprontaria.

2

Um sujeito que seguia

Para tratar dor de dente

Em outra localidade

Viu o bando pela frente.

Era o Pedro Batatinha

Que suspeita alguma tinha

Do seu castigo iminente.

3

Naquele dia, o inocente

Escutou dois estampidos,

Sem saber que se tratava

Dos cangaceiros temidos.

Chegando perto do fato,

Viu que dum assassinato

Eram os tiros ouvidos.

4

Eis que os cabras referidos

Tomaram o seu dinheiro,

Obrigaram-no a seguir

Com eles em seu roteiro.

Por dois deles ladeado

O Batatinha, coitado,

Ficou num certo terreiro.

5

Tendo instinto carniceiro,

A dupla surrou o moço.

Estava aterrorizado!

De reação nem esboço...

Terminado o espancamento,

Mais um chegou, o tormento

Passou a ficar mais grosso.

6

Em meio a tanto alvoroço,

Depois de levar um couro,

Batatinha foi mandado

Por um tal Cordão de Ouro:

"Abaixe as calças, seu cabra!"

E veio a cena macabra:

Foi castrado feito um touro.

7

Suas 'bolas', seu tesouro,

Viu ali serem cortadas

O resto ficou inteiro

E as criaturas malvadas,

Perante sua tortura,

Essa triste desventura,

Caíram nas gargalhadas.

8

Assistiu as presepadas,

Lampião, calado, mudo,

Mas falou ao comandado:

"Diz aí se cortou tudo."

"Deixei o resto, patrão,

Pois é jovem, garotão.

Só vai é ficar pançudo"

9

Sacando um punhal agudo,

Lampião tirou um naco

De uma orelha do rapaz

Que tinha perdido o saco

E disse: "é para marcar!

Outra vez que te encontrar,

Vou reconhecer, malaco!"

10

Deixaram o cara fraco,

Com uma dor bestial.

Antes de sua partida,

Virgulino, o maioral,

Recomendou aos presentes:

"Tratem dele, diligentes!"

Foi-se o bando do local.

11

Batatinha, mesmo mal,

Sobreviveu à ferida.

Tratado, deu testemunho

Da crueldade sofrida.

Já contada em verso e prosa,

Mais uma história espantosa

Pelo cangaço trazida.

12

Não pode passar batida

A ironia que lhes trago.

Alguém vai cuidar do dente,

Nem imaginando o estrago

De uma dimensão tamanha:

Perde seu dinheiro, apanha

E fica sem nenhum bago.