Negra ou branca?

Negra ou branca?

Conhecida como branca

Na certidão de nascimento

Vivendo a realidade

Que não diz no documento

Porque o cabelo crespo

Fala alto no momento.

Desde de criança aprendi

Que a cor branca pertencia

Mesmo com cabelo crespo

Que muita angustia trazia

Chamado de pixaim

E de negra da Bahia.

Bombril de ariar panela

Ou ninho de passarinho

Era cabelo de buxa

Não recebia carinho

Ninguém passava a mão

Como se fosse espinho.

Apelidos eram muitos

Branca de cabelo ruim

Sem ter o entendimento

Do colorismo sem fim

Do branco que não é branco

Que atingiam a mim.

Senti o embranquecimento

Da nossa população

Me obrigando seguir

Estilo que era padrão ,

Tem que ter ’cabelo bom’

Com consciência, ou não.

Escova, alisamento

Um sofrimento danado

Puxa de lá e de cá

Para ficar arrumado

Mas a raiz insistindo

Que queria ser mostrado.

Foram anos de sufoco

De falta de identidade

Em busca de aceitação

Dentro da sociedade

Fugindo do preconceito

Procurando igualdade.

Alisando o cabelo

Para se dar bem na fita

Recebendo referências

No meu íntimo, aflita

Aquela não era eu,

Não me achava bonita

O tempo foi se passando

A vontade de mudar

Meu cabelo natural

Fui pensando em resgatar

Até que criei coragem

E parei de alisar.

A decisão não foi fácil

Muita gente a criticar

Esse cabelo está feio

Por que não vai arrumar?

Cadê a cabelereira

Resolveu te abandonar?

Amigos me encaravam

Com ar de decepção

A família criticava

Com muita indignação

Mesmo assim eu resisti

Continuei no padrão.

O tempo foi se passando

Todo mundo acostumou

Hoje ninguém fala mais

Fato normal se tornou

Meu cabelo é minha marca

Muito feliz eu estou.

A barreira do racismo

Aos poucos sendo quebrada

Assumindo as origens

A resistência aumentada

Mostrando empoderamento

Da mulher na caminhada.

É preciso ter coragem

E vontade de mudar

Para entrar no processo

De transição capilar

Tomada de decisão

Feliz da vida ficar.

Assumir cabelos crespos

Torna-se ato político

É uma decisão única

Pode ser momento crítico

Mas eleva a auto estima

Empoderamento mítico.

Mulher precisa mostrar

Que tem personalidade

Ver que autoaceitação

Muda a realidade

Assumindo os seus cachos

Com especialidade.

Se alisar o cabelo

Pra se sentir adequada

Lidando com preconceito

Hoje a coisa está mudada

Valorizar as raízes

Da mulher empoderada.

Cabelo é a minha coroa

Mostra de onde estou vindo

Fazer chapinha jamais

Vou continuar sorrindo

Ache ruim quem quiser

Assim eu vou resistindo.

Posso até ter pele branca,

Mas negritude na veia

Represento o meu povo

Com brilho que encadeia

Esta mistura de cores

De prazer me bombardeia.

Autora: Luciene Torres de Albuquerque