Crônica de Natal

Poderia ser uma história real,

Ou, uma mera ficção,

Mas, de fato

Escapou da crônica policial

Pois, não houve convicção

No relato...

Ainda que fosse uma história virtual,

Nestes tempos das maravilhas da informática

Poderia ser mero boato

E não ocupar nota na coluna social

Coisa de vidente, búzios e cartas, astrólogo

Na virada do ano,

se repete e há quem ache chato...

Eis que finalmente surge o conto

E não era tradicional

Talvez um pouco vulgar

Que mesmo depois de pronto

Insiste em se re-criar

E se transformar em uma história nacional

Inserida no contexto do lugar, qualquer lugar...

Como em um quebra cabeças

Vão se juntando as peças

A rima da narrativa

Não encontra alternativa

Há que se falar do conto ou quiçá do canto

Em que se transformou, em pranto...

Nem nas viagens gramaticais

Pode a carroça da história avançar

Sem que se dê conta

Da história de seres angelicais

Recolhendo rejeitos (do consumismo humano)

na penumbra da noite sem cansar

Que utilizam papelão como manta...

Poderia ser uma mera presunção

De um poeta querer no tablado das ruas.

Interpretar o teatro vivo do cotidiano tomando do pintor

uma aquarela que retrataria um pulsante coração.

De histórias que ciclicamente se repetem, nuas e cruas,

Desde Cervantes, Dickens, Victor Hugo, Drummond, Dostoievski, Galeano...

Mas onde estará o conto no verso?

Se o livre discorrer já não retrata o livre viver

Talvez nas contas do terço,

Que silenciosamente a fé de uma mulher,

Sob a marquise a apontar

E com olhos fixos penetra meu ser...

Apenas um sorriso quando desvela o sagrado jantar...

E antes que entregue o pão

Ela acena para outros tantos que almejam

Dividir transformando em um milagre da multiplicação

Para compartir com gente em sua volta, não importa quantos sejam,

Cativado por altruísta demonstração

Busquei no encontro dos olhares, a paz daquela noite, vejam...

Não foram precisos títulos outorgados

Na verdade poucos gestos singelos

Que não eram estereotipados

Para que a universal linguagem brotasse e quebrasse os elos.

Se fizesse presente, pelo simples desejo de reunir os despojados,

Em improvisada mesa de mármore da calçada, para uma ceia sem estampas ou selos...

Nada a comemorar! Tudo a comemorar!

O encontro acontece por um simples ato de doação.

AjAraújo, o poeta humanista, escrito no Natal de 2001.