A Velhinha Ninja do Metrô

Era uma terça-feira chuvosa daquelas que Salvador parece querer lavar a alma de uma vez por todas. O metrô na Estação da Lapa, entupido de gente às 7h32 da manhã — horário nobre do empurra-empurra, disfarçado de ‘com licença, por favor’.

No Terminal, um mar de guarda-chuvas pingando no lombo alheio. O vagão chega, abre as portas, e começa uma coreografia de guerra: corrida de quem quer sentar nem que seja no grito, desfile das mochilas assassinas e olhares de "não fale comigo que ainda estou dormindo".

Lá vem ela: uma velhinha aparentemente frágil, miudinha, de coque bem preso e vestida com um casaquinho de crochê cor de rosa, que devia ter mais tempo que o Elevador Lacerda. Parecia inofensiva. Mas só parecia.

Ela entra, olha ao redor, e se depara com um rapaz esparramado no banco (daqueles que todo mundo sabe que é dos mais vividos, mas finge que não entendeu), perna aberta como se o metrô fosse a sala da casa dele. A senhora se aproxima com calma e pergunta com voz doce:

— Ô moço, será que você podia me ceder esse lugar?

O rapaz, de fone no ouvido, sem nem tirar o olhar do celular, responde com desdém:

— A noite foi pesada, tia... tô com uma ressaca da zorra. Sinto muito, mas não dá pra levantar, não.

Ah, meu amigo... naquele momento, o destino dele foi selado.

Ela dá um passo pra trás, respira fundo, tira os óculos da ponta do nariz e... pluft! — abre um guarda-chuva vermelho-dragão. O povo se assusta, claro, chuva dentro do metrô? Não, era ela assumindo sua verdadeira forma: A Velhinha Ninja do Metrô.

Com um movimento ágil, ela gira o guarda-chuva no ar como se defendesse o último acarajé da fila. Dá uma pancada certeira na perna dele, um golpe de mestra. Então, levanta o guarda-chuva acima da cabeça e grita:

— Na minha época, homem que não respeitava idoso levava chinelada, mas agora leva guardachuvada.

A plateia, ou melhor, os passageiros abrem espaço sem nem pensar duas vezes. O rapaz tenta argumentar, mas está encolhido, envergonhado, com o ego mais molhado que a Avenida Paralela. Sem ter muito pra onde correr, ele se levanta murmurando, derrotado. Ela, então, guarda a arma (digo, o guarda-chuva, claro), ajeita o casaquinho rosa e senta-se, triunfante, enquanto a galera no vagão começa a aplaudir.

Na Estação Bonocô (eu bem que desconfiei que fosse daquelas bandas), ela desce gloriosa como se nada tivesse acontecido. Só faltou a trilha sonora de filme de ação e a fumaça de efeito especial.

No final das contas, fica o aviso: nunca subestime uma senhora de casaco de crochê quando a chuva cai. E, mais importante ainda, respeite os mais velhos — ou prepare-se para a vingança do guarda-chuva justiceiro.