A Alegria do Coração Lavado

Havia um silêncio que pesava nos ossos,

mais denso que a noite no deserto.

Um verão seco onde as palavras murcharam,

onde a garganta era um poço vazio,

e o pecado, um manto de chumbo costurado à pele.

Davi carregava o peso como quem arrasta

uma pedra gravada com seus próprios erros.

Até que a voz do Senhor rachou o céu,

não como trovão, mas como brisa que antecede a chuva:

"Não há alegria no esconderijo, filho meu.

Por que guardas o que eu já conheço?

Por que escondes o que eu já quero cobrir?"

E então ele confessou—

e o alívio veio como chuva em terra rachada,

como o primeiro sopro depois de mergulhar fundo.

O salmo brotou leve, um canto de pássaro livre,

porque a culpa já não tinha raízes:

"Como é feliz aquele cuja desobediência foi desatada,

cujo pecado não é mais sua sombra,

mas apenas uma história onde a graça escreveu

'coberto' sobre o que antes condenava. "

Paulo, séculos depois, ecoou a mesma verdade,

não como repetição, mas como descoberta:

*"Bem-aventurados os que não precisam mais

de máscaras nem de contas a acertar,

pois a fé os veste de luz,

e a dívida foi paga por quem já tinha

assinado o perdão antes mesmo da falta."*

Era a mesma alegria, o mesmo sopro de alívio—

não porque o pecado fosse pequeno,

mas porque a misericórdia era imensa.

Porque Deus não limpa apenas as mãos—

Ele lava o que as mãos escondem.

Vê o que os olhos não confessam,

o que a boca engoliu em segredo,

e mesmo assim,

"Se confessarmos, Ele é fiel e justo

para nos limpar de toda injustiça."

Não como quem varre a poeira para debaixo do tapete,

mas como quem sepulta no mar o que já não deve ser lembrado.

Então a crônica se repete em nós:

o pecado era um fardo,

o perdão, um rio.

E agora?

Agora somos o salmo que Davi escreveu,

não como espectadores, mas como versos vivos.

Gritamos de alegria não porque somos imaculados,

mas porque fomos lavados.

Nos unimos aos puros de coração—

não os que nunca caíram,

mas os que se levantaram

e descobriram que a pureza

não é ausência de queda,

mas presença de graça.

E o coração puro é aquele que sabe:

foi lavado, não por suas próprias águas,

mas pelas marés da graça—

que não perguntam "até quando?"

mas cobrem,

sempre cobrem,

até que o que restou

foi apenas o brilho

do que foi perdoado.