O juntador de moedas

Por volta das 19h20 do dia 15 de abril, olho pelo reflexo da janela de uma van e deparo-me com a seguinte cena: um cidadão simples, com os embargos da sobrevivência nas costas, contando moedinha por moedinha no chão esburacado de uma calçada — quase como se fosse um ritual ao fim do dia. Qual valor têm, para seu João (nome fictício), esses trocados? Talvez uma moedinha para o pão, outra para o café e, quem sabe, a próxima para a aguardente após mais um dia árduo de trabalho.

Será que João tem consciência de que seu trabalho poderia ser remunerado como o de um trabalhador comum? Pergunto-me: ao invés de juntar moedas, poderia ele estar ganhando notas, a fim de garantir uma sobrevivência digna?

0,05 centavo: assim confirma-se a pequena esperança de, trocado em trocado, garantir um simples café da manhã.

0,10 centavo: a sensação de um pouco mais! Talvez possa comprar um pequeno lanche para sustentar a fadiga.

0,25 centavo: oh, essa é melhor! Já se consegue, talvez, completar um café da manhã — que sonho!

0,50 centavo: um mero cidadão teve a compaixão de olhá-lo com piedade e dar-lhe um pouco a mais. Que felicidade para tal senhor! Será que dará para completar um almoço?

0,75 centavo: meu Deus! É quase o máximo. O mesmo deve pensar: "Posso até conseguir comprar uma passagem" — e deixar os rastros de suas raízes em outros lugares.

1,00 real: finalmente, o “major”! Com quantas moedas dessas pode-se garantir o café, um almoço completo e, talvez, um jantar irregular. Imagine só, que grande alegria ainda ter algo para se alimentar ao fim da noite, depois de passos calejados pelo trabalho.

Eis-me aqui, em reflexão: que sociedade é essa, que se contenta em ver a felicidade de um simples morador de rua ao amontoar seus trocos, enquanto outros gozam de tufos de notas — pois é, notas — 5 reais, 10 reais, 20 reais, 50 reais, 100 reais, e até 200 reais! Inacreditável. Será que João consegue ver a vida além da sobrevivência? Será que nossa sociedade, no geral, está pronta para ter uma visão além do sustento material, do trabalho árduo e de contar os trocos magros no fim do mês?

João, nunca mais o verei, mas vejo em seu ato e em seu olhar um guerreiro invisível aos olhos de uma sociedade doente. Desejo-lhe, do fundo do coração: que um dia conte notas, grandes notas, e garanta o que realmente merece — assim como todos nós, meros cidadãos dominados, também temos direito!

Não me julgue por convicções políticas polarizadas por apenas defender que as pessoas tenham condições dignas de ter um lar, acesso à saúde, à educação, ao lazer e, principalmente, à fonte maior da felicidade. Que sejamos parte de um grupo que batalha não apenas pela sobrevivência, mas que busca enxergar o caminho da plenitude.

João é só mais um exemplo da desigualdade social gritante em nosso país, mas merece ser visto — assim como tantos outros "Joões" existentes no Brasil.

Como última provocação, deixo-lhes: olhem além da superficialidade, percebam o mundo fora de sua bolha. Não sejam pessoas subjacentes à situação miserável em que se encontram nossos irmãos. Reflitam. Ajam. Principalmente, ajam — garantindo assim uma sociedade participativa em causas sociais e públicas. Enquanto cada um se preocupar apenas com o próprio umbigo, esquecerá daquele que conta suas moedas com a intenção de comprar um utensílio básico do dia a dia. Sejamos humanos em nossa total potencialidade.

Cora Fox
Enviado por Cora Fox em 16/04/2025
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