CULTO AO(S) SIMPLES


         
Estrada estreita, de terra vermelha, rasga o campo de mata baixa: veia de pó, cicatriz de cerrado. De sua borda voa um carcará, abandonando o alto do cupinzeiro: posto de observação... Ave guardando a morada da mãe da terra, raiz do mundo: seu princípio e alimento. Mulher de indefinido encanto, helena deusa cabocla, habita uma casa pobre que, de tão minguada, não comporta tanta magia. A energia se espalha pro lado de fora. Seu templo é um telheiro. Sob o altar, o fogo. Sobre o altar, sem cálice ou vinho, ferve num caldeirão o alimento primitivo, reunindo os simples em rudimentar comunhão.

          Esse texto é uma homenagem a Dona Helena que, com o marido João, mora nas terras da Cachoeira do Fundão, onde se chega atravessando o Parque Nacional da Serra da Canastra., pelo município de São Roque de Minas, em Minas Gerais. Foi ela quem preparou, num fogão a lenha, a comida mais gostosa que já experimentei: feijão mulatinho, arroz, farinha de milho, abobrinha verde refogada e um caldinho de pimenta comari pra arrematar. Resisti, bravamente, à oferta de um ovo frito. Se aceitasse, não acreditaria que aquilo tudo era verdade. Extrapolaria o real...

          Em tempo: Dona Helena e Seu João acham até bom não ter televisão. Só assim economizam “as vistas”...


Rosane Coelho
Enviado por Rosane Coelho em 29/01/2006
Código do texto: T105547