Condolências Divertidas: Por um velório menos chato

Uma pesquisa realizada pelo tablóide The Daily Telegraph revelou que uma das músicas mais tocadas em velórios na Austrália é o classico do AC/DC, ‘Highway To Hell’. Sinistro ou unusitado? Particularmente prefiro alguma letra mais leve. O fato é que sempre achei uma chatice os velórios tradicionais. Não bastasse todo o sofrimento da família em perder um ente querido, ainda ficam horas (ou dias) olhando pra caixa de presunto decorada com flores. Aí, chega aquele primo chato, ou o político aproveitador, senta-se ao lado da víuva ou outro familiar do defunto e começa a falar. O roteiro é quase sempre o mesmo: presta suas condolencias, diz que sente muito, oferece alguma ajuda, consola. Aí procura os colegas ou conhecidos que compartilham do mesmo recinto. Pega um cafézinho e começam a conversar. Quase sempre falam sobre as situações engraçadas vividas pelo desencarnado, lembram-se das encrencas e situações ridículas em que ele se meteu. E riem. Alguns riem baixinho. É um festival de cochichos. O pior é passar a madrugada num velório. Geralmente só ficam alguns familiares e amigos mais chegados. E quase nunca ficam ao lado do caixão. Sentam-se em algum banco do lado de fora e começam a conversar. Até o mais engraçadinho contar uma piada. Aí vira um festival de besteiras e risinhos contidos. O brasileiro é assim. E se você acha que não é assim, é porque não prestou atenção ou foi pra casa dormir. Sou da seguinte opinião: morreu, chorou, enterrou. Quando muito, coloca o paletó de madeira por uma ou duas horas para visitação. Ah! Mas tem os parentes de longe, que vão demorar a chegar. Aí fica meio complicado, mas sugiro que peça à funerária para levar o corpo para o velório somente depois que todo mundo chegar. Sim, pois velório é uma coisa muito chata! E eu não curto exibicionismo, portanto não gostaria nem um pouco de ver todo mundo me vendo apertado dentro do caixote envernizado. Há alguns anos fiz um acordo com um grande amigo. Pedi a ele que meu velório teria que ter música.

E se alguem quiser tomar uma cervejinha, um vinho? Tá liberado! A não ser, é claro, que a ocasião não seja só minha. Se houver outro presunto na sala ao lado, esqueça a vitrola e a birita. Mas nada que um fone de ouvido não resolva. E por favor: nada de chorumelas. Pior que as chorumelas é aquela mania chata de elevar o morto a santo. Ninguém é santo e todo mundo comete erros. Então, esqueçam a hipocrisia e não fiquem repetindo coisas do tipo “ele era uma pessoa maravilhosa!”, ou “foi a melhor pessoa que já conheci!”. Não! É mentira! Quem ousar dizer isso deverá ser vaiado. E se for dia de feira, que fica bem ao lado, não esqueçam do meu pastel. E não peçam fiado à japonesa só porque é pro morto. Se for alguém que nunca me pagou nada na vida, será a chance de se redimir. E tem mais: duas ou três horas de velório é o suficiente. Uma daquelas coroas de flores, com alguns dizeres irônicos não seria má idéia. Depois chamem o coveiro e digam ‘Bye, big Pinna’s! Quem quiser chorar, pode chorar. Emoções e sentimentos não são fáceis de controlar. Mas quem quiser cantar e sorrir, boa! Com certeza o ambiente ficará bem mais agradável, o ar mais leve. Não esqueçam de uma grande salva de palmas. Em pé, obviamente, já que ninguém se atreve a sentar em um túmulo próximo.

E depois é só voltar ao trabalho. Nada de dizer ao chefe que ‘era uma pessoa muito próxima, vou ficar para o enterro...’. Aí lá se vai um dia inteiro de trabalho. A pesquisa do The Daily Telegraph mostrou que não sou o único a achar que os velórios convencionais são uma chatice. Na lista das mais tocadas em velórios ainda aparecem os clássicos My Way (Frank Sinatra), Wonderful World (Louis Armstrong) e Starway to Heaven, do Led Zeppelin.

E quem me conheçe sabe que já passei por situações bem difíceis que envolveram o tema. Mas a gente amadurece, observa e constrói opiniões. E assim a vida passa.

Da minha parte, mantenho a mesma posição que falei ao meu amigo. Gravei um CD com algumas das minhas canções prediletas. Está guardado, reservado para a ocasião. Não é questão de quebrar conceitos ou destuir valores. É só opinião, ora pois. Se fazem festas para tudo, chega e partida, nada mais justo que o velório também ter um lado festeiro. Ainda mais porque você nunca mais vai ver o ‘homenageado’. Então, que seja em grande estilo. Então, no meu velório, espero que nenhum familiar ou figurão tente acabar com a festa. Se eu for o único empacotado do dia, podem gritar, xingar, contar piada, cantar, fazer stand-up comedy. Rodinha de violão e um sarau de poesia não seria mau. Quem se opor, eu volto pra puxar o pé à meia-noite. É bom, porque assim só ficam os amigos, os chatos vão embora e a coisa fica bem mais divertida.

Pinnas
Enviado por Pinnas em 03/08/2008
Código do texto: T1111260
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