A avó

Esta história é verdadeira. Afirmo que é verdadeira, já que muita gente não vai querer acreditar. Até porque, para nós, brasileiros, as histórias da segunda Grande Guerra são muito distantes, muito nebulosas. Mas quem viveu a guerra, não esquece jamais. Como Sabina e Ana nunca esqueceram.

Sabina tinha perdido a filha única, uma jovem de 26 anos, logo no início da guerra, logo que os alemães ocuparam seu país. A filha de Sabina era uma pessoa especial que não se calava diante das injustiças, e, foi uma das primeiras judias a serem fuziladas na cidadezinha que moravam, na fronteira da França com a Alemanha. Sabina só não morreu de dor, porque a filha lhe entregara a netinha de um mês apenas, Ana, para ser criada pela avó, “se acontecesse alguma coisa”. Mas com o passar dos dias, as saudades da filha e vendo o marido, os amigos, sendo presos ou desaparecendo, Sabina pensou muitas vezes em desistir, em se entregar ou em se matar junto com o bebê. Porém, quando Ana sorria para ela, Sabina ganhava novas forças e sentia que devia continuar. Até que as duas também foram presas, avó e neta, levadas para um terrível campo de concentração. Se Sabina já estava desesperada e deprimida antes da prisão, agora ela ia conhecer o inferno. Para comer, somente as sobras das refeições de seus carcereiros.

Todos os dias, as temidas despedidas dos companheiros que seguiam para morrer nos fornos a gás. Sabina e Ana, sabe-se lá porque, iam sendo poupadas. Mas de que adiantava, se tinha acabado totalmente o pão, que era a única coisa que vinha alimentando o bebezinho, que já estava magrinho que só vendo. Sabina sabia que dentro de pouco tempo sua netinha ia morrer de fome. E não havia saída. Ela tinha que ficar vendo a netinha definhar até morrer e não podia fazer nada, nada mesmo. Ou podia?

Foi então que Sabina teve aquela idéia inacreditável, uma loucura, mas quem sabe poderia funcionar? Sabina botou o bebê faminto no seu seio. No velho e já murcho seio de uma mulher de 50 anos. Que não amamentava ninguém há quase 30 anos. E a criança sugou, sugou e...o leite veio. E veio muito, e alimentou Ana e mais duas crianças. E salvou sua netinha. Leite produzido, não por hormônios de mãe, mas pelo amor avó. Um milagre difícil de acreditar. Mas eu conheço Ana, que hoje também é avó e vive no Brasil. Juro que conheço. Juro que tudo é verdade...

Lilia Barcellos
Enviado por Lilia Barcellos em 28/04/2006
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