O Quadro

Quero morrer, mas não sinto o perdão. Fiz algo horrível e tento me confortar. No entanto, falta-me tempo. Não sei o quanto é provável, mas gostaria de encontrar sossego. Os dias não têm sido fáceis. Tento me distrair, mas o barulho do silêncio me impede. Que mágoa essa que me persegue! Por quê? Estou farta disso! E não posso aguentar. Quero atirar um copo de vinho contra a parede e saudar o estrago. Quero sentir e não ter medo. Vou estraçalhar essa agonia. O cheiro da solidão é podre e me faz mal. Sinto náuseas. Procuro me esconder, mas é em vão. A busca ainda continua quando ouço passos. De onde vêm? Parecem distantes. Parecem vir de minha cabeça. E se meus miolos estourarem? O que poderia acontecer? Quem veria? Quem viria? Ou o que seria de mim sem minha própria vida destruída? Nada, além disso. Posso sentir o vento no alto da colina. De tão longe, tão intenso. Uma solução para o fim: esperar. E acontecer por indecisão. Sufocante esse ar que me cerca. Preciso parar de respirar por uns segundos, sentar-me e encostar a cabeça. Como se fosse um descanso. Repouso eterno. Pego-me alimentando forças intransigentes. Agora, de repente, sou forte feito aço. Levanto a cabeça e puxo o gatilho. Os miolos estraçalham-se, batendo contra a pintura manchada de vermelho. Formas inconstantes. Perco a razão. Coloco os dedos sobre os olhos e eu mesmo os fecho. Não vejo nada então. E a pintura diz o resto.

Milena Verri
Enviado por Milena Verri em 05/05/2006
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