Segredos do silêncio
 
                   Sentada na varanda de minha humilde cabana, olhando a exuberância da quietude e a extraordinária placidez do tempo, o silêncio do momento segreda-me ao ouvido alguns pensamentos que venho propositalmente recusando-me a não olhá-los. O sol acaba de se despedir do dia com um longo e caloroso abraço, saiu caminhando em direção ao poente, mais antes, voltou sua face e depositou na mão um beijo, e soprou! O céu coloriu-se! Matizou-se por alguns minutos em gozo transcendental ao repouso do sol. As andorinhas, como que do nada, pipocaram no céu numa sinfonia ondulatória tão sincronizada que até me parece que elas fizeram um ensaio para este momento.

                  Eu continuo sentada na minha varanda a observar os murmúrios e cochichos do silêncio. Imóvel, vejo algumas borboletas indo beijar as rosas no terreiro, elas estão vindo beber o encanto do final da tarde antes de se recolherem em seus esconderijos. Ao longe, um canto solitário rasga a quietude do momento, sem, entretanto, quebrar a magia. É a inhambu indo para o ninho, chamando o companheiro disperso em outras paragens e, o silencio diz-me:__ percebes? Assim mesmo acontece nos lares. Quantas esposas esperam nas datas festivas para brindarem com seus companheiros se quer um sorriso, mas muitos já brindam em outros palácios.

                  O vento, com sua elegância perene, passa por mim, dá um beijos em meus cabelos e parti assoviando, avisando que a noite está chegando e, lentamente, exatamente como as bananas que a gente tenta vê-las amarelar e não consegue, a noite chega. Recolho-me ao interior de minha cabana. Estico minha rede e permito-me ficar enquanto o sono não me abraça. Então, mais uma vez, o silêncio vem segredar-me alguns pensamentos e, força-me a pensar sobre coisas que eu não quero acreditar! 

                  E insiste! Deflagra na retina dos meus olhos o óbvio e, diz-me:___ vê que este céu não é o mesmo céu de outrora, que esta paz que aqui ainda se insinua, já não existe na vastidão do mundo. O medo e a violência subjugaram a paz e a quietude; a mentira e a indiferença subjugaram a verdade e a confiança; a ganância e a individualidade subjugaram a partilha e a união. Nenhum homem formou o mundo; nenhum homem criou a terra; nenhum homem plantou a natureza, esta foi formada em consonância com o equilíbrio da vida, não especificamente para o homem. 

                  Chorei tomada pela emoção do silêncio. Então, o sono chegou. Tomou-me nos braços e levou-me num sonho ainda mais perturbador e, sonhei! Andava eu por uma trilha toda ladeada de arbustos, tudo era tão verde e florido que a sensação era a de estar caminhando por entre os pórticos de um paraíso. Minha visão não abarcava tanta beleza e meu ser completamente ébrio de emoção, regurgitava a lembrança do escarcéu de outro mundo tão conhecido meu.

                  Estava agora numa subida íngreme, a qual me levou ao alto de uma colina. Silêncio! Paz! E o silêncio me disse:___ olha! Eis aí os teus pensamentos, os teus desejos. Então, vi o homem vivendo em harmonia com o planeta, com a terra, com a natureza, com seus iguais e, todos possuíam a sua morada. Havia líderes, mas não existiam dominadores; havia proprietários, mas não existiam senhores; reinava a vida e contra ela não existiam algozes.

                  Crianças eram crianças até que o tempo as fizesse adultas, os idosos eram a fonte do saber e para eles todo o respeito e consideração até o dia de suas pálpebras se fecharem. Enquanto eu estava olhando, de repente tudo foi ficando longe, longe, muito longe, então um ruído surdo adentrou os meus ouvidos e eu despertei. Não era o som de um trovão, não era relâmpago e nem tão pouco tempestade, era o som da modernidade cortando o céu que me trouxe de volta à realidade. Nem pássaro, nem canto, nem borboleta, apenas eu e a modernidade.