Eu hein, Rosa?

Amanheci e o dia estava azul. Um sol de inverno banhava de luz tépida a varanda que me acolhe para ler o jornal. O pé da roseira brinda meus olhos com as primeiras rosas vermelhas e brancas em pleno agosto de Rio das Ostras. As cadelas se estiram pelo chão e absorvem aquele calorzinho que lhes anima ainda mais o sono. Em um dos quartos, minha filha viaja num mar de almirante; no outro, Marcela saboreia uma preguicinha depois do café da manhã. Sempre achei curioso esse retorno ao nicho de Morfeu depois de já se ter se levantado. Dona Nerly perambula pela casa atolada em seus afazeres domésticos, todos ao mesmo tempo.

Meu café é tímido, e apesar do estágio cinquentão, ainda conservo a velha mania botiquineira da média e pão com manteiga na chapa. Assim, ao menos aos sábados e domingos, eu revejo o rapazola, office boy da Otis Elevadores, fazendo seu magro repasto matinal no Bar do Armênio, em Marechal Hemes. Essas lembranças me trazem saudades que dão alegrias e me fortalecem mais que comida.

Lido o jornal e aplacada a fome que eu não tinha, vou ao computador. Confiro os e-mails, essa forma de comunicação supersônica que nos roubou a alegria de ver o carteiro à nossa porta e, no Recanto, leio os amigos. A última crônica da queridíssima amiga Rosa Pena - "A Injustiçada", salvo engano - deixou-me de orelhas em pé. A idéia de que nossa longevidade é diretamente proporcional ao tamanho do pavilhão auditivo, arremessou-me ao banheiro para, frente ao espelho, fazer uma avaliação das minhas próprias orelhas. Cheguei a pedir à Marcela uma fita métrica para avaliação mais precisa. Os demais membros da casa elegeram o nariz como desproporcional em relação ao resto da cara. Fiquei tenso. Nariz não serve para esticar a idade, amiga?

Saí meio cabisbaixo do computador e fui ter uma conversa ao pé-do-ouvido com a minha consorte. Com um sorriso maroto no canto dos lábios, aconselhou-me umas cervejinhas para relaxar e, de quebra, lavar o carro. Obedeci-a, e ao ligar o pen drive para animar a lavagem, veio a primeira música: Eu hein, Rosa? Relaxei e dei aquele toque na orelha de quando gostamos de alguma coisa.