Um dia de chuva...

Terminou a visita da tarde... Uma hora discutindo vários casos, vários assuntos médicos. E eu estava sozinha.

Refleti sobre esse estado de inteira contemplação da solidão. Todos estavam em seus respectivos afazeres. Eu apenas assisti tudo acontecer por aquele breve minuto, tentando me localizar no espaço. Tentando saber o que seria de mim naqueles momentos.

Enquanto o professor foi embora e os enfermeiros faziam coisas que independiam da minha existência, lembrei que não poderia ir embora. Mas não havia o que fazer ali por enquanto.

Não tive medo de ficar sozinha. Mas, me deu angústia a indecisão.

Caminhei então, para algum lugar no momento indefinido, tentando encontrar a resposta imediata.

Busquei auxílio em meio as dúvidas. Em meio ao estranho. Em meio a minha desordem espiritual. Precisava daquele momento também.

Estava frio. Algo inesperado para nossas condições de tempo...

Mais uma surpresa para aquele momento.

Ainda estava descabelada. Cheguei à porta do hospital, caminhei lentamente, típico do andar do devaneio, da dúvida, do desencontro. Logo uma chuva chata e preguiçosa me anunciou que o céu chorava.

Olhei para cima, estava tudo melancólico. Refletindo cada pedaço da minha impressão. Continuava ali, à beira da rua, esperando o sinal mudar de cor. Vendo os pára-brisas trabalharem incensantemente. Como os corações.

Como aqueles corações, que mesmo doentes, se esforçavam, se compensavam, trabalhavam dobrado. Só porque é necessário.

Atravessei a rua e uma bicicleta passou por mim, quase me atropelando. Ela não estava sozinha. O homem que a guiava, apressado, não me pediu desculpas. Apenas seguiu seu trajeto, crente que tudo aquilo era necessário.

Correr, muitas vezes é necessário. Mas o mais importante, é manter a calma para tomar decisões importantes.

Foram mais ou menos essas as palavras de uma residente da cirurgia geral, nos alertando quanto aos pacientes que chegavam grave. "Não precisa se alarmar, não adianta. O importante é manter a calma e fazer o ATLS." Ela se referia a um algorítmo que a gente aprende para lidar com essas situações.

No momento pensei em quanta verdade e maturidade haviam naquelas palvras. Ela muito jovem. Como eu. E com decisões sempre tão difíceis à mão.

Sentei naquela lanchonete. Pedi uma vitamina. Resisti à tantas tentações realmentes perigosas à saúde.

Abri um livro. E de soslaio olhei para a rua.

A chuva triste continuava.

O tempo continuava zombando do meu estado de espírito.

Os carros continuavam vindo. As ambulâncias chegando. E eu perdida em pensamentos confusos...

Jule Santos
Enviado por Jule Santos em 24/08/2009
Código do texto: T1772574
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