BOLHAS DE SABÃO

Quando criança, passava horas encantada olhando as bolhas de sabão, translúcidas, coloridas, a voarem, de maneira louca, desordenada, mas nem por isso, menos serenas, tranqüilas, em direção ao céu, levadas pela força do vento e por sua natural e inerente leveza.

E cada qual, em seu preciso e incerto momento, se desfazia em nada, deixando apenas a beleza de terem existido diante do meu olhar que, entre extático e surpreso, as seguia, num contínuo deslumbrar. Um olhar que apenas absorvia a beleza, sem buscar nenhuma compreensão. Pelo simples prazer.

Já longe da minha infância, nem por isso menos criança, continuo a ver as mesmas bolhas que se formam dia após dia, na forma das coisas de minha vida, tristezas, alegrias, preocupações, esperanças.

Tanto quanto aquelas da minha meninice, estas bolhas se desfazem com o tempo que passa, e ainda deixam, como aquelas, seus sinais de beleza, marcas indeléveis na pele da alma, que já não tão inocente,

tenta reter as bolhas consigo, com presteza, sem perceber que sua beleza não está nelas mesmas, mas na presença que tiveram e na lembrança que deixaram. A alma, endurecida pelas experiências não muito boas, tende a esquecer-se do prazer da contemplação pura e simples. Sem maiores explicações. Sem necessidade de reter nada.

Já sem a inocência infantil, não vê, não percebe, a sutileza da mensagem contida no existir e deixar-se ir. Custa muito e leva tempo para que, longe da infância, percebamos que o que nos toca de fato, o que nos transforma, não é o fato, a existência das coisas ou dos seres que amamos: o que nos faz outros é na verdade, o momento em que a forma,

da bolha, das coisas, das pessoas, dos momentos fugazes, já desfeitos, já distantes, deixam em nós sua marca, suas cores, sua lembrança bem definida, aquilo de que fomos capazes de viver, olhar, aprender, sentir e que nos deram outras asas, antes inexistentes, para alçar vôos mais altos,

acima das bolhas já desfeitas.

Ainda me extasiam as bolhas de sabão.

Ainda as vejo nas pessoas que fazem diferença em seu passar, mesmo silencioso, por minha vida.

Ainda vôo nas asas da bolha de sabão, na transparência de suas cores,

busco minha própria transparência, asas para meus vôos internos , para além das minhas dores.

Ainda me encanta ver a leveza com que as bolhas se desfazem no ar.

Tento aprender com elas minha própria leveza, entender sua mensagem de que é preciso estar leve para ser capaz de continuar mesmo quando a bolha insiste em estourar.

Ainda me encantam as bolhas de sabão.

Ainda há uma criança em meu olhar, que permanece, ainda que sem razão, extasiada, em alegria pueril a admirar as bolhas que vêm e vão.

E uma mulher tentando aprender com as bolhas de sabão...

Débora Denadai
Enviado por Débora Denadai em 19/05/2005
Código do texto: T17873
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