Silêncio

Nunca havia parado para pensar no silêncio. Parece banal, irrelevante, mas em determinado contexto, vem se afigurar como a um tesouro. Nele mergulho, buscando toda dor de minha alma, nos momentos de imensa tristeza. Através dele também encontro os sorrisos brotando como rosas em jardim.

Vem-me a recordação do silêncio de Maria, mãe de nosso Deus, que tão bem soube guardar seus mais íntimos sentimentos, por um amor puro e sem máculas. Pode enfim estender este mesmo amor a todos, adotando-nos como seus filhos. E hoje, recorro a esta santa mulher, mais uma vez. Meus lábios cerrados por sensações que jamais poderiam ser expressas por palavras, envolvem todo meu ser na intimidade de minha essência.

E lá... Encontro respostas, companhia, desafios, energia e uma inexplicável força. Tudo isto me leva a um estado de inebriante bem estar. O mundo, lá fora, torna-se distante, e eu, como a passear por entre sonhos e esperanças.

Sinto-me só, uma solidão que me traz a presença de meu Criador.

Sinto-me fraca, de uma fraqueza que me leva a força do Deus que aprendi a conhecer e amar.

Tudo então se mistura numa inexplicável simbiose que me deixa com a certeza de nada entender. Meus dedos tremem, procurando apalpar meu rosto, como em busca da confirmação de tal realidade, que me fascina e amedronta.

Silêncio de uma paz escondida... Terreno longínquo que exige o cessar dos rotineiros ruídos. Por entre meus pensamentos, uma onda suave me toma, me leva, me envolve.

Silêncio do amor procurado... Nada a compreender, apenas entrega. A doce embriaguez do amor sem limites. Aquele que não admite barreiras e não traz dentro de si a cobrança de condições para existir.

Silêncio que se impõe para sentir bem perto minha alma a chorar e sorrir, transformando os sentimentos em reais sensações, presentes que se misturam trazendo-me o toque do Deus Criador. Alma humana, alma minha, que se eleva à distância incomensurável, penetrando em horizontes jamais percebidos, permitindo estar diante de uma grandeza que consome todo meu ser.

Silêncio da dor, dor real, dor do corpo, que castiga o coração e me faz retornar a consciência do mundo a minha volta. Por instantes voei para bem longe, mas a dor se fez presente, atraindo-me a atenção para a fraqueza de minha humanidade.

Volto então aos antigos anseios, que me fazem lutar pelo conforto, pelo aconchego do corpo. A dor que incomoda e que me faz sofrer. Não é uma dor insuportável. É pequena, insistente e dominadora. Faz-me pensar que preciso colocar pés no chão, caminhar e fazê-la retroceder.

Recordo-me então de meus devaneios, de minhas indagações acerca da dor humana. Dor física, dor emocional, dor do vazio, dor pela dor. Inexplicável mistério diante do homem. Sua presença a ninguém agrada, mas torna o homem mais voltado para o outro que passa, às vezes despercebido, mas... No momento da dor, quão irmão é este transeunte...

A dor que me leva ao silêncio... O silêncio que me leva a dor... Ambos me trazendo Deus. Presença mais nítida na noite da alma. É luz que brilha em minha vida. Clareia as sombras de meu ser, aquece o frio que se impõe no vazio de minha alma.

Silêncio, silêncio profundo, da busca incessante de uma verdade. Embala-me e me traz a ingenuidade de minha infância, os sonhos de minha juventude e a consciência de minha maturidade.

Silêncio do ser, silêncio da dor, silêncio do riso. Meus olhos então procuram o ponto mais distante que podem alcançar, procurando unir todo meu ser à grandeza do Deus Criador. E aí, neste exato lugar, encontro o silêncio do mergulho na natureza divina, onde minha alma se alimenta.

Pouco a pouco este silêncio que me envolve me faz feliz, pois encontro a unicidade de minha natureza, sem limites, sem dores nem lágrimas. Apenas o âmago do espaço interior, vindo à tona, brotando com toda beleza de saber-se presente num mundo criado por Deus. E Nele se percebe seu princípio e seu fim.