Bingo!

Bingo!

Meu amigo se agitava na cadeira toda vez que alguém gritava a palavrinha mágica. Já perdeu a conta de quantas cartelas já tinha comprado e cada rodada que não ganhava era um desespero. Sorte. Mais sorte. Muita sorte. Não estava num bom dia, sabia disso, mas sua mulher não sabia que ele tinha ido a um bingo para tentar pagar algumas contas atrasadas. O que ia dizer pra ela que além de gastar o dinheiro, que já era pouco, com jogo de azar, e põe azar nisso, não tinha ganhado nem um pirulito por consideração.

Bingo!

Quem gritou dessa vez foi um senhor e Valdir teve vontade de estrangulá-lo. Por que não eu? Por que não eu? E ele tinha ficado por um número. Raios! Nunca vou ganhar essa birosca! - esbravejava. A ideia de ir pro bingo foi do Fonseca. Maldito Fonseca.

- Ô Fonseca, não ganho nenhuma - reclamou pro amigo que estava ao seu lado.

- Calma Valdir, bingo é um jogo de paciência. Logo você ganha.

Bingo!

Mais uma vez Valdir não ganhou. E eu que fui uma vez só ao bingo, apareci nesse lugar dias depois e lá estava o Valdir perdendo dinheiro. Não deu outra, na segunda rodada eu ganhei um prêmio considerável, olhei para o Valdir para cumprimentá-lo e ele me fuzilou com seus olhos de ódio e inveja. O que o jogo não faz com o homem? Tinha que achar um jeito de tirar o Valdir daquele jogo. Mas como? E os gritos de bingo iam se espalhando pelas mesas. O Fonseca até saiu de perto, pois o azar estava respingando nele. Solitário na mesa, Valdir começou a surtar. Chegou a gritar bingo! Mas era alarme falso. Quando perguntado o motivo de ter gritado, respondeu que queria ouvir de si mesmo aquela palavra tão emblemática.

Bingo!

Quem gritou dessa vez foi um vereador da cidade. Sacanagem! Valdir não podia acreditar. Será que aquela casa de bingo não era séria? Só me faltava essa. Desconfiado que era, cogitou a ideia de que a casa conspirava contra ele. Ou pior: será que a mulher dele descobriu e fez uma armação contra ele? Absurdo! Ela tem que fazer com que eu ganhe! - pensou Valdir com seus botões que estavam abertos, muito calor! Muito calor! Agora vai! Agora eu ganho!

Bingo!

Quem será que foi o infeliz que criou esse jogo? Valdir lembrou que leu no jornal que o governo tinha proibido as casas de bingo. E por que ali estava funcionando? Tinha a menor ideia. E se a polícia aparecesse? Além de não ganhar nada, corria o risco de ser preso, pagar fiança. Sua mulher iria estrangulá-lo. O jogo transcorria normalmente, só faltava um número para ele fechar, mesmo assim estava desacreditado, perdeu a conta de quantas vezes estava por um número e não ganhava nada.

Bingo!

Alguém gritou bingo! E ele não reconheceu a voz. Todos olhavam para ele. Será que fui eu quem gritou? Seria possível? Só pode ter sido eu! Então gritou de novo: Bingo! Bingo! Bingo! Chegava a gritar alto e de repente a porta principal do bingo foi arrombada por policiais. Parados! Não se mexam. Ah não! Justo agora? Não podiam ter esperado um pouco mais? A polícia foi até o organizador do bingo e o algemou e Valdir torcendo para que não fosse preso também, não se importava de ficar sem o dinheiro, mas preso jamais! Apareceria nas capas de jornal e sua fama de azarado já estava espalhada e o flagrante da polícia lhe renderia o título de azarado do ano, ou até pior, azarado do século, imaginava as manchetes: Azarado que nunca ganhou foi flagrado pela polícia justamente quando conseguiu pela primeira vez!

Bingo! Bingo! Não! Bingo não!

Valdir se virava na cama até ser acordado por sua mulher. Querido! Querido! Acorda!

- Que foi?

- Você tava sonhando e gritando bingo que nem doido!

- Sonhando? Nossa que alívio! Pensei que tinha sido preso.

- Você foi a alguma casa de bingo?

- Não, não, nunca fui.

- Então o que essa cartela cheia de números?

- Sabe o que é querida...

05/12/09

Miguel Rodrigues
Enviado por Miguel Rodrigues em 05/12/2009
Código do texto: T1961377
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