POESIA FLUMINENSE

A POESIA SATÍRICA NA DÉCADA DE 1920.

[Início de um trabalho sobre a poesia satírica fluminense]

Texto de Nelson Marzullo Tangerini

No Século XX, mais precisamente nos 1920, Niterói era tomada de assalto, no bom sentido, por uma plêiade de poetas magníficos. Eles se reuniam no legendário Café Paris [1], onde elaboravam jornais e revistas e escreviam e declamavam poesias. O referido Café foi demolido, após incêndio, no início da década de 1930, para a construção da Av. Amaral Peixoto. Mas o Paris ainda vive na memória de muitos abnegados que guardam documentos da época e trabalham para que a memória literária de Niterói não caia no esquecimento

São Paulo fervilhava. A Semana de Arte Moderna de 1922, comandada pelos paulistas Mário de Andrade e Oswald de Andrade, demorou, porém, a chegar à antiga capital fluminense, ainda que esta estivesse próxima da Capital Federal, onde morava o pernambucano Manuel Bandeira.

Muitos dos poetas “parisienses” eram exímios sonetistas. Dois deles, Luiz Leitão e Nestor Tangerini transitavam entre a poesia satírica e a poesia lírica, dentro do metro exigido pelos antigos parnasianos. Ficaram, porém, mais conhecidos pela interessante poesia satírica que escreveram.

A Nitpress, depois de mais de 80 anos, relançou o livro de sonetos Vida Apertada [1926], de Luiz Antônio Gondim Leitão, considerado por Alberto Valle, membro da Academia Fluminense de Letras, o maior sonetista satírico do Estado do Rio de Janeiro.

Outros poetas havia: Mazzini Rubano, Brasil dos Reis, Olavo Bastos, Apollo Martins, René Descartes de Medeiros, Mayrink, Varon. Mas estes poetas optaram pelo que restava do Simbolismo, do Romantismo ou do Positivismo. E foram igualmente grandes.

O objetivo deste trabalho é que centremos nosso estudo nas obras de Luiz Leitão e Nestor Tangerini, resgatando, assim, a tradição satírica na poesia de língua portuguesa, vindo das Cantigas Medievais Portuguesas [de Maldizer e de Escárnio], passando por Bocage, Tolentino, Gregório, Tomás Antônio Gonzaga, Oswald de Andrade, entre tantos outros.

Vale ainda ressaltar que a poesia de Leitão e Tangerini, apesar da forma parnasiana, “emparedada” no soneto decassílabo ou em trovas [7 sílabas], tem, em seu conteúdo, a verve dos primeiros modernistas que abalaram as estruturas da poesia parnasiana de Olavo Bilac, Alberto de Oliveira e Raimundo Correia. Faziam reescrituras de muitos textos do passado, na forma de paródia [As fitas e Ouvir estrelas, sonetos de Luiz Leitão, parodiando, respectivamente As pombas, soneto de Raimundo de Oliveira e Via Láctea, de Olavo Bilac; A casa do Sr. Elias, de Nestor Tangerini, parodiando Visita à casa paterna, soneto de Luís Guimarães Jr.], apelavam para a descontração [Minhas dívidas e Ao público, sonetos de Luiz Leitão], usavam a ironia [Elas, de Luiz Leitão; Paralelepípedo, homenagem a Alberto de Oliveira, O Príncipe do Verso, e Vocação, de Nestor Tangerini], o sarcasmo [Uma tragédia, de Luiz Leitão], a irreverência e escreviam sonetos-piada [A vovó, soneto de Luiz Leitão]. Tinham uma visão cômica da vida e se aproximavam, muitas vezes da fala popular [como veremos em Cenas do Rio (iniciando uma período com o pronome oblíquo “me” – fala de D. Ivete) ou em Quando ela passa (“num desejo malvado de comê-la”), sonetos de Nestor Tangerini]

A poesia satírica não é encontrada apenas na Era Medieval, no Neoclassicismo ou no Modernismo – ou na fase transitória entre Parnasianismo e Modernismo [Café Paris]. Volta e meia ela aparece em Fagundes Varela [Romantismo] e Cruz e Sousa [Simbolismo], sendo que os poetas medievais [das Cantigas de Escárnio e Maldizer], Bocage, Tolentino, Gregório, Tomás Antônio Gonzaga, Luiz Leitão e Nestor Tangerini, satíricos exímios, dedicaram-se exaustivamente ao gênero, ainda que Leitão não fosse tão agressivo e cítrico como Tangerini.

Fora do circuito Rio – São Paulo, a poesia satírica fluminense ficou relegada a 2o. plano. Nem mesmo é citada pelos literatos de plantão.

[1] Recentemente [2009] houve exposição sobre o Café Paris no Centro de Memória Fluminense, na Biblioteca da UFF, no Gragoatá, em Niterói, RJ.

Nelson Marzullo Tangerini, 54 anos anos, é escritor, jornalista, compositor, poeta, fotógrafo e professor de Língua Portuguesa e Literatura. É membro da ABI, Associação Brasileira de Imprensa, e do Clube dos Escritores Piracicaba [ clube.escritores@uol.com.br ], onde ocupa a Cadeira 073 – Nestor Tangerini.

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Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 16/12/2009
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