A Arte de ser Bobo ( Grande ser tão veredas )

Prêt-À-Porter me trouxe a " A arte de ser bobo" da caríssima Clarice. Fiquei todo feliz com o inesperado presente. Propus a sua imediata leitura em voz alta. Afinal, estávamos em plena semana santa e, pela mais que milésima vez, um autêntico bobo fora crucificado para o regozijo dos espertos.

Marcinho serviu-nos, enquanto a Regina procurava a filmadora para registrar o acontecimento, como sempre acontece na Amendoeira, espaço alternativo de ecléticos sabores.

Enquanto lia, Prêt-À-Porter tentava evitar a câmera, mas não sem os protestos da Regina:

- Prêt, deixa de ser bobo!

Mas era para ser. Estávamos ali para isso. O semblante alegre do agora septuagenário amigo, atestava uma bobice dígna de um Riobaldo frente a Diadorim sem neblinas.

O bobo é feliz porque não tem malícia, essa arma de uso exclusivo dos espertos. O bobo atinge seus objetivos porque não sabe que é cilada o que se interpõe no caminho e, distraído, passa sem pressa alguma. O bobo não tem astúcia, mas coração. E como não sabe que zombam dele, vê em todos os dentes um sinal de amizade, e ri como as crianças frentes a um perigo muito grande. É que o bobo tem olhos apenas para ver as coisas.

O bobo não pensa que a vida é um jogo. Pensa que é vida, e que o jogo é apenas o lúdico para o qual nascemos sem traição. Aliás, para o bobo, trair é apenas se estar enganado e mudar de opinião, direito que ele acha inalienável. O bobo acredita em Papai Noel não por tolice, mas por acreditar que essa crença é um tempero a mais acrescentado à vida. Para o bobo, amar é verbo intransitivo como Mário propora.

Ser bobo é ter contato com as estrelas, e acreditar que cada brilho mais forte é uma razão para se estar mais apaixonado. O verdaeiro bobo nem sabe que é bobo. Bobo são os outros, os espertos. O bobo tem vida longeva porque não vê que a morte é castigo, mas apenas contingência. O bobo é tímido. Não gosta de aparecer quando tantos podem fazê-lo por ele.

Eu viajava nos pensamentos quando Prêt-À-Porter aterrissou-me:

- Bobou, homem?

Parecia um Medeiro Vaz recém-saído das veredas.

- Bobei, chefe!

E Clarice sorriu salvando o meu dia. Quanto à rosa, sabem os bobos, ela fala!

Aldo Guerra
Enviado por Aldo Guerra em 04/04/2010
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