INESQUECÍVEIS!!!

Fui instado ou solicitado ou estimulado - dependendo do olhar pedagógico do leitor - a escrever sobre professores inesquecíveis. Existem?Existiram?Durante o processo de reflexão que antecede o ato de escrever, deparei-me com um texto de Paulo Geraldo que acabou por comprovar-me que existem os ditos professores inesquecíveis e eles são muitos e andejam por aí no anonimato.

O fragmento textual de Paulo Geraldo, que transcrevo a seguir, me deixa na obrigação de retirar alguns professores do anonimato que a história lhes dedicou :

“No passado do poeta que escreveu versos sublimes, há quase de certeza um professor que o obrigou a exercitar-se na sintaxe, que o forçou a corrigir vezes sem conta frases mal escritas, que ralhou com ele quando se desleixava. Na juventude daquele que escreveu uma bela sinfonia houve muito possivelmente uma professora, talvez já velhota, que lhe explicou cem vezes, pacientemente, qual era a forma correta de colocar as mãos quando se sentava ao piano.

O poeta e o músico tiveram o seu nome escrito na História, mas ninguém recorda quem foram os seus mestres. No entanto, há uma beleza imensa nesse passar despercebido, nesse ter rasgado as mãos ao trabalhar nos escuros alicerces de um mundo melhor. Uma beleza que só é apreciada pelas grandes sensibilidades, como são as daquelas pessoas que se dedicaram de corpo e alma à educação. Uma boa parte da humanidade prefere aquilo que dá nas vista ou produz frutos imediatos...”

Nos dias atuais, fala-se muito em método, abordagem adequada, moderna, humanista, mas vou falar de professores como mestres que me conduziram até aqui, sem me preocupar com a escola pedagógica a qual pertenciam ou se filiavam. As primeiras professoras foram maternais e por isso firmes, convincentes, ternas e dedicadas, não raros delicadas e sobretudo tinham postura de educadoras e, por favor, não me peçam para explicar o que é postura de professoras, é inadequado demais para o texto que apenas se propõe a viajar pelo campo das lembranças. Acredito que hoje com a proliferação de cursos e de pensadores em educação, todos saibam o que é, entretanto se não souberem, posso afirmar que a Lucia Regina, a Leda, a Gilca , a Dileta, a Nevina e a Mirian, lá no distante e sempre presente Grupo Escolar Joaquim Nabuco,na lendária Tupanciretã, sabiam muito bem e talvez não por isso,mas também por isso se tornaram absolutamente inesquecíveis.

Depois da aprovação na temida Admissão ao Ginásio (o primeiro vestibular da nossa vida), adentramos a Escola Estadual Mãe de Deus e aí foi um rebuliço danado: um professor para cada matéria, entreveros de cadernos e livros e surge a professora Vânia, elegante,muito bonita e com sua bem apresentável sacola mágica (espécie de sala de recursos pedagógicos portátil) de onde saiam esquadros,réguas,compassos e talvez até uma varinha de condão, na tentativa de nos ensinar os caminhos da arte, do belo e o tão sonhado campo afetivo sendo estimulado e trabalhado para somar-se ao cognitivo no rumo de uma aprendizagem completa.

Inesquecível!! A habilidade do Paulo Couto enchendo o quadro negro com uma fantasmagórica equação do segundo grau, o qual ia dissecando de forma clara e concisa (matemática tem que ter claritude e concisão), dissipando os fantasmas euclidianos, pitagóricos e outros tantos que habitavam os abissais da matéria.

Que falar das provas do Nestor Mantese?Uma folha de papel almaço para quatro equações “sangiorgianas” e “quintelanas” valendo dois e meio pontos cada uma. Como aprendemos e não ficamos traumatizados com esses métodos tão arcaicos e antiquados?

“Alons enfants de la Patrie,/le jour de gloire est arrivé !/contre nous de la tyrannie !/L’étendard sanglant est levé.....”. E lá vem a professora Gládis Veríssimo, elegante como Josephine,imponente como Dumouriez, mais exigente e disciplinadora que Bonaparte e por mais incrível que possa parecer,muito moderna,muito avançada para sua época.Suas aulas eram participativas,muito musicais e como nada fixa mais que uma imagem,uma canção ou um poema,ainda hoje guardo alguns versos de uma velha canção romântica que costumava cantar conosco: Fenetre ouverte/On écoutait le bruit des vagues/Des vagues vertes qui se brisaient sur le rivage/On restait là les yeux fermés sans se parler/Comme ayant peur que ce bonheur ne soit pas vrai/On aurait dit une chanson, le bruit des vagues...”

Skinner seria chamado e decomposto em idéias para classificar alguns de meus professores inesquecíveis, como a professora Iolanda que verbalizava as causas, porquês e consequências dos fatos históricos, com tal propriedade que parecia ter estado presente aos acontecimentos, e fiel ao modelo da época, nada de marcar com cruzinha (sim, a famigerada já estava chegando para assinalar a sepultura do raciocínio escrito), eram poucas e exaustivas questões de argumentação ou de responder por escrito. Pode parecer inapropriado, cansativo e antipedagógico aos pensadores de hoje, mas que nós aprendemos é um fato e fatos são fatos, falam por si.

Uma imensa lista de sufixos, prefixos e radicais greco-latinos me lembra a professora Isolda, formação das palavras, produção de textos, à época, a temida e lendária composição. Estilo tradicional, participação estimulada e controlada, respostas curtas e secas para as impertinências da idade e a matéria, num crescendo quase assustador, sendo cobrada e bem cobrada, sabia tudo e transmitia melhor ainda.

Português também era cátedra do professor Orlando com seus livros de linha Marista e sua tranquilidade franciscana. Esse me iniciou literariamente ao incentivar-me a escrever cem vezes “Não devo comer bergamotas na sala de aula”, texto que foi modificado logo após meu hábeas corpus civilizado (acolhido em parte) afirmando ser limão a fruta que estava comendo.

Que dizer do austero, diligente e competente professor Balbinot? Quase pré-Skinner,quem sabe até pavloviano,diriam,fosse analisado aos olhos de hoje,mas que nos ensinou a navegar pelos meandros e labirintos da tão querida Língua Pátria.

E foi por aí, na fantástica Terra da Mãe de Deus, entre esses inesquecíveis mestres que aprendi uma lição para toda a vida: Escrever exige introdução, desenvolvimento e conclusão. E no meio? Recheia-se com aquilo que a vida ensinar e como bem aprendi e disso faço uso quase diário, creio deva ficar por aqui, embora muito ainda possa ser dito sobre e para Professores Inesquecíveis.

moises silveira de menezes
Enviado por moises silveira de menezes em 10/05/2010
Código do texto: T2247843