EU TE AMO

EU TE AMO

Maria Teoro Ângelo

Enquanto esperava, fiquei olhando tudo à minha volta. As pessoas iam e vinham e nada me chamava a atenção, nada daquele flash, daquele instante que desperta o desejo de escrever. É isto o que se entende por crônica. É aprisionar uma emoção e daí cessa tudo o que a antiga musa canta. É hora de criar algo novo.

Uma senhora mal vestida, gorda e grisalha veio se aproximando. Trazia na mão um balde com água, esponja e sabão. Parou na esquina e ficou observando o muro. Nele estava escrita uma mensagem de Ano Novo assinada, presumo eu, por algum político. Para ilustrá-la foram desenhados pássaros voando e um ninho cheio deles. A mensagem dizia: “ Que os sonhos de paz se aninhem no coração dos homens.” No alto, num cantinho, havia a assinatura do pintor: Pomini.

A mulher continuava observando o muro. Olhava, olhava como quem procura algo. Passou por ela um mendigo; trocaram idéias e ela continuou observando o muro com muita ansiedade. Da minha estratégica posição eu assistia ao desenrolar da cena que estava ali bem em frente, do outro lado da rua.

De repente, como quem toma uma decisão definitiva e arriscada, ela começou a esfregar o nome do pintor com bastante força. A espuma era abundante e espessa e as letras desapareceram. Pude ver em seu rosto sinais de vitória; estava atacando o inimigo.

Em minha ignorância do que se passava pensei que o pintor fosse inimigo dela . A mulher, então, jogou água na espuma e o nome Pomini reapareceu ainda mais legível. A tinta preta era poderosa e não saía à toa. A mulher ficou desesperada. Andava de um lado para outro olhando o muro e o fracasso da sua investida.

Não aguentei. Atravessei a rua e fui ter com ela. “ Por que a senhora quer apagar este nome?”

“É que a mocinha da casa onde trabalho me mandou apagar uma declaração de amor: eu te amo, que escreveram para ela e ela não quer.”

“ Mas aí não está escrito eu te amo. É o nome do pintor.”

A mulher nada disse. Teve vergonha de dizer-me que era analfabeta, como tivera vergonha maior de dizê-lo à patroazinha. Foi por isso que saiu procurando a esmo, em meio a tantas letras, algo que pudesse ser eu te amo.

Dobrei a esquina e logo adiante estava escrita com letras enormes a tal declaração. Eu então a adverti de que água e sabão não iriam apagar. De fato, água e sabão jamais iriam apagar aquele amor, se a tal declaração fosse sincera e nem a mágoa, se por ventura, fosse um amor não correspondido.