Coluna Mulher em Busca

Autoconhecimento, Espiritualidade, Saúde e Valores

A vida continua. Essa frase me bateu em cheio, dia desses, antes de escrever esta coluna. Ela nasceu de uma conversa com uma conhecida recente. Passava ela por uma situação dolorosa, vendo uma de suas filhas lutar contra um câncer de mama. Disse-me ao telefone que, à exceção do trabalho, havia aberto mão de todas as suas atividades, principalmente daquelas que lhe proporcionavam algum tipo de prazer. Conversamos ainda por algum tempo e, ao terminar a ligação, fiquei pensando nesse comportamento que nos é tão comum quando nos defrontamos com a dor, principalmente quando ela atinge alguém muito próximo a nós. Conheço bem o sentimento de impotência que nos invade quando queremos evitar que o outro sofra e constatamos que, infelizmente, nada podemos fazer nesse sentido. Esse sentimento beira ao insuportável quando atinge alguém que amamos profundamente, mais do que qualquer outra coisa na vida. Refiro-me aqui ao sofrimento de um filho. Acostumadas a protegê-los desde o primeiro minuto de vida, ainda em nossos ventres, é extremamente difícil para nós, mulheres, aceitarmos o seu sofrimento. E nos fechamos quando, por força das circunstâncias, essa situação se apresenta em nossas vidas. Como minha conhecida, julgamos que, abrindo mão daquilo que nos proporciona prazer e alegria, estamos ajudando, estamos mostrando solidariedade. Sem falar no sentimento de culpa que geralmente nos assola (“como posso estar-me divertindo enquanto ... sofre?”).

Vivi, num passado recente, uma situação traumática com um de meus filhos. A força que encontrei dentro de mim me surpreendeu e hoje, anos depois, compreendo que ela foi fruto de todo um trabalho de buscas pessoais e existenciais que vinha desenvolvendo havia alguns anos. Foi essa a sustentação que me permitiu enfrentar com coragem e determinação o grande desafio que tinha pela frente. Naquela ocasião, logo depois do acontecimento em si, lembro-me de ter observado a luz do dia e os semblantes de um razoável número de pessoas que passavam por mim na rua. Algumas me pareceram felizes e despreocupadas, enquanto que eu sofria. Essa constatação foi muito importante. Ela me trouxe a consciência de que os ponteiros do relógio não haviam parado de girar em função de minha dor. A vida continuava lá fora, aparentemente sem se importar com o que estava acontecendo comigo, com o meu mundo interior, com as minhas bases, com o meu filho. A vida simplesmente continuava e foi ela, a força da vida, que me despertou para a compreensão de que eu também precisava continuar, apesar de tudo. E eu continuei, sem abrir mão de nenhuma de minhas atividades, inclusive daquelas que costumavam proporcionar-me prazer e alegria. Com essa experiência aprendi que não precisava penalizar-me, que não precisava potencializar ainda mais a dor que sentia.. Ela era minha. Estava dentro de mim e não nas atividades que exercia. Certamente não era uma atitude “para baixo” que meu filho esperava de mim. Muito ao contrário. Precisava ele, naquele momento de total fragilidade, sentir-me forte a seu lado. Era essa a mais importante ajuda que lhe poderia dar; o porto seguro que deveríamos representar, para nossos filhos, em todas as fases de seu desenvolvimento; o espelho em que se miram; o exemplo que, na maioria das vezes, carregarão vida afora; era esse o comportamento que esperava de mim. E então, ao invés de me fechar, abri-me, ainda mais, para a vida. Percebi que, por alguma razão, ela me vinha pondo à prova. Talvez, quem sabe, para testar até que ponto eu estava sabendo fazer uso, na prática, de todo o conhecimento que adquirira nos anos anteriores. Parece que é assim que ela funciona. Sempre nos pondo à prova. Como uma criança querendo testar a autoridade de seus pais, pedindo e cobrando limites.

Aprendi, entre outras coisas, com o episódio referente a meu filho, que a dor faz parte da condição humana e que, por mais que nos empenhemos, jamais conseguiremos eliminá-la, de todo, de nossas vidas. Quer queiramos, quer não, ela nos chega mais cedo ou mais tarde, de uma maneira ou de outra. Não adianta fugir. Porém, por maior que seja a nossa dor, ela é pequena diante da dimensão da vida. A dor passa. O tempo opera milagres. E então, como que deslumbrados, descobrimos que o sol voltou a brilhar, como se ele não estivesse sempre estado ali. Percebê-lo, mesmo nas fases de intensa dor, pode fazer toda a diferença.

Caso você, leitor da Prana, esteja vivenciando nesse exato momento alguma situação dolorosa, gostaria de ser um anônimo vaso de flores na porta de sua casa, como a lhe dizer que não está sozinho. Gostaria de servir de alimento para a sua alma, de força para que continue em sua luta. Você a vencerá como tantas outras que já venceu. Que essa experiência possa servir-lhe de referência para que, no futuro, encontre dentro de si a coragem necessária para enfrentar novos e maiores desafios. Que a dor que agora sente atue, de alguma maneira, para despertar o guerreiro que existe dentro de você.

Com muito carinho e um afeto sincero,

Regina Dias, escritora e palestrante, autora do livro Mulher em Busca,

editoras Mauad e Bapera

Site: www.mulherembusca.com.br

E-mail:reginadias@mulherembusca.com.br

REGINA DIAS
Enviado por REGINA DIAS em 08/06/2005
Código do texto: T23120