CRÔNICA #036 - PULA, RAPAZ! VOCÊ NÃO DISSE QUE TEM CORAGEM?

Setembro de 1984. Uma calma manhã de primavera baiana, ou seja, muito calor e poucas ou quase nenhuma flor. Nessa época morávamos no Edifício Acará, no terceiro andar, mas com o playground e mais duas garagem, correspondia ao sexto.

Minha esposa estava nas últimas semanas de gravidez de nossa filha caçula. Sonolência compatível com sua gestação. Por volta das 8 e meia da manhã, ela dormitava em nosso quarto, como toda e qualquer mãe, com os olhos fechado e ouvidos bem alertas.

De repente, ela ouve algo que a deixou apreensiva e curiosa. Nosso filho mais velho, de cinco, dizia para o de três: “Pula, rapaz! Você não disse que tem coragem?”. Como ele repetia isso mais vezes, a mãe levantou-se e foi na direção de onde vinha aquela inocente vozinha. Ao chegar à sala de estar, quase desmaiou ao contemplar o nosso filho de 3 anos com minha mochila amarrada nas costas, pendendo para fora, agarrado apenas com uma das mãos na janela, pronto para pular e sair, segundo ele, voando feito o super-homem.

Num esforço sobre-humano, minha esposa procurou manter a calma e, com voz mansa e suave disse: “Não, meu filho! Não, faça isso! Volte o outro pé para a janela! Isso! Agora, pule aqui para dentro!” Assim ele fez! Quando eles estava seguro, em chão firme, ela chamo ou dois e deu-lhes boas palmadas e disse que nunca mais fizessem aquilo.

Às 9 horas chego exausto do trabalho e sou recepcionado por minha amada toda apavorada: “Sei que você não gosta que lhe traga problema assim que chega do trabalho, mas preciso contar logo o que aconteceu”. Depois de contar-me tudo, pediu para não bater nos meninos, pois ela já os tinha castigado. Então, chamei-os e lhes expliquei que ninguém consegue voar e que o super-homem é uma história que não existe e que nunca mais fizesse uma coisa daquela. E, se quisesse saber mais sobre qualquer coisa, era só me procurar que teria o máximo prazer de esclarecer tudo. Mas o choque fora tão grande que me sobressaltou uma tremenda enxaqueca que passei o dia em observação no pronto socorro, tomando soro e sedativo.

Dá um frio na coluna só de pensar como teria sido nossa vida se o nosso caçula tivesse mesmo alçado vôo. Teríamos nossas vidas destruídas, nossa privacidade invadida e jamais seríamos capazes de explicar o que de fato teria acontecido. O que pensariam de nós? Certamente a mídia sensacionalista nos teria condenado tal como tem feito com casos semelhantes. Ainda bem que tudo foi sabiamente resolvido e agradecemos a Deus por preservar nossa família integralmente.

Até hoje o nosso caçula dos homens, guarda aquela mochila de couro de camelo que um dia quase o levou para voar com os anjos, como testemunho de tão grande livramento.

Louvado seja Deus!!!!

Alelos Esmeraldinus
Enviado por Alelos Esmeraldinus em 22/10/2010
Reeditado em 24/02/2011
Código do texto: T2571300
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.