Viver no Brasil

Perguntaram a Tom Jobim como era viver nos Estados Unidos e como era viver no Brasil. O genial maestro disse que viver nos Estados Unidos é bom, mas é uma m*****; que viver no Brasil é uma m***** mas é bom. Disse tudo, não disse?

Numa conversa de balcão de sorveteria, ouve-se o comentário: este é o melhor país pra se morar. Com ceticismo, um dos fregueses deu uma risadinha. (Acho que estava pensando na bagunça política – eufemismo para imundície e vilania – que assola nosso país.) Quando saiu, revoltado comentou: ninguém fala em países como Tailândia, ninguém fala em Nova Zelândia, ninguém se refere ao Canadá, à Austrália, que coisa! Sempre o Brasil, o Brasil e o que este país oferece? Que melhor país, que nada pra se morar!

Com certeza, apesar de ter rodado bastante este mundo, esqueceu-se de que aqui não há terremotos, não há inverno rigoroso, não há neve – e quando tem é uma festa, não temos avalanches, o país inteiro fala uma língua só, temos gente trabalhadora – é mentira que o brasileiro não gosta de trabalhar: basta levantar cedinho e ver a multidão que pega no batente tão logo amanhece. Esqueceu-se das praias, da facilidade de produzir comida: o presidente também não sabe disso. Esqueceu-se dos rios, das matas, das nascentes dos rios, da alegria espontânea do nosso povo. É. Ele está revoltado com tudo que está acontecendo na esfera dos governantes.

Ponderei com ele. Disse-lhe que é, sim, sem qualquer dúvida, o melhor país pra se viver. Imagine experimentar sobreviver num ranchinho à beira de um rio. Se não houver ambição desregrada, se o estilo de vida escolhido for bastante simples, sem consumismo, sem inventar necessidades, você poderá perfeitamente viver a vida inteira por ali, disse-lhe e ele concordou. Aí lembrei-me do Tom Jobim. O que torna viver no Brasil uma m****, o que atrapalha, dificulta, inviabiliza, impede nosso crescimento, impossibilita um arrancada, obstrui nosso caminhar, torna impraticável um viver tranqüilo ... são estes cafajestes que um dia, como povo, escolhemos para nos representar.

Lúcia Helena
Enviado por Lúcia Helena em 23/10/2006
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