Festa de pobre

Antônio Teodósio recebeu o dinheiro dos precatórios do Sinter* (Pelo início, vocês já viram que esta é uma crônica de ficção), pagou suas dívidas, limpou o nome nos cartórios, SPC e Serasa, trocou geladeira, moto, comprou uma tv de 29 polegadas, reservou uma ponta para pequenas reformas no muquifo e, decididamente, resolveu fazer uma festa pra comemorar aquele dinheiro considerado perdido.

Alexandre Maresia, compadre de Teodósio, é dono de restaurante e, eventualmente, ganha um trocado organizando festas e recepções. Convidado para promover o regabofe, apareceu para elaborar um orçamento para o amigo.

Depois de ouvir as pretensões de Antônio Teodósio, caneta na mão, abriu a agenda e a negociação:

- Música ao vivo? Temos aí a Banda Chapéu de Couro que é muito boa. Forró pé-de-serra de primeira. Pra tocar durante quatro horas de pau enfiado sai por 1800..., mais 400 dos equipamentos de som...

- Não, Alexandre. Tá alto...

- Bom, tem ali um pessoal no Treze: Banda Rela Bucho. Eles podem fazer a festa por uns 1200...

- Não, compadre. Ainda tá fora das minhas possibiliades...

- Compadre, tem um rapazinho com órgão e eletro-ritmo. Acho que ele faz por uns 600...

Teodósio retirou a calculadora do bolso, abriu o extrato bancário, fez contas, rabiscou, somou, diminioi e, coçando a cabeça, disse que o Zezinho dos teclados ainda tava acima das suas posses. Fecharam, então, com a última opção: um DJ por 300 reais.

- Agora vamos à comida: um buffet com bolinhos de bacalhau, unhas de caraguejo, camarões empanados, casquinhas de siri e mais alguns acepipes com frutos do mar dá pra fazer a 25 reais por cabeça. 100 pessoas, dá 2500.

- Tá alto, compadre...

Alexandre pensou em desistir, mas, em consideração:

- Tá bom, compadre. Se nós fizermos um coquetel com canudinhos, empadas de frango, pastéis, quibes, esfirras e rissoles fritos na hora, dá pra fechar em oito reais a cabeça. A gente pode começar com macaxeira frita pra encher o bucho do pessoal...

- Oitocentos...? ‘Inda tá acima das minhas posses, compadre. Eu tou desembolsando 300 pro dijei... Tem a cerveja, o refrigerante, o Galiotto...

Alexandre fechou a agenda, guardou a caneta no bolso, levantou-se e falou:

- Compadre, tu quer festa de liso. Com esse teu dinheiro, o ideal é fazer uma panelada dançante... – Bateu a porta e sumiu.

*Sinter – Sindicato dos Trabalhadores de Educação em Roraima.

Nota do autor: o pagamento dos precatórios se arrasta há anos e, pelo andar da carruagem, os professores nunca receberão o que lhes é devido.

e-mail: zepinheiro1@ibest.com.br

Aroldo Pinheiro
Enviado por Aroldo Pinheiro em 06/03/2011
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