A (Des)eleitora

Roraima é uma síntese do que acontece no Brasil. Politicamente, então... As situações mais absurdas ocorridas por aqui são cópias do que se vê no País como um todo.

Se já tivemos um presidente que parafraseava os Livros Sagrados e praticava o “é dando que se recebe”, porque haveria de ser diferente cá nestas plagas? Clientelismo e paternalismo, pústulas da política brasileira, também estão impregnados à política roraimense. Muitas gerações terão passado até que nos livremos do círculo vicioso: o político compra votos porque o eleitor quer vender; o eleitor vende voto porque o político quer comprar.

A história se repete de dois em dois anos. Nos anos pares, de abril a outubro, o movimento de pedintes nos gabinetes, comitês, escritórios e residências de políticos é intenso. Grupos se organizam, distribuem entre si endereços de candidatos a serem atacados; depois, reúnem-se para fazer um balanço do que conseguiram. No dia seguinte retomam a maratona, tendo cuidado de não repetir políticos visitados. Os pedidos são os mais diversos: compra de gás, pagamento de contas de água e luz, dinheiro para medicamentos, passagem para tratamento médico, passagem para visitar parente, dinheiro para construção de túmulos, ajuda para festa de batizado, enxoval para bebê, telha, cimento, madeira..., e por aí vai.

Cabo eleitoral (nessa profissão há tanto tempo, que já deveria ter sido promovido a sargento), Abdias, me contou a história:

Um eleitor - desses que pedem até injeção na testa - era cliente assíduo na casa do candidato. Foi atendido uma vez; ficou freguês. Pedia tudo: motor para geladeira, bujão de gás, pagamento de conta de luz, aviamento de receita, cesta básica...

E lá veio ele de novo. Agora, alegava que sua mãe estava muito doente e precisava fazer exames em Manaus. Com a proximidade das eleições, o candidato viu-se obrigado a atendê-lo. Para não perder o voto, revoltado, desembolsou dinheiro para a passagem e algumas despesas da genitora do eleitor.

Na antevéspera do pleito, o pedinte reapareceu na casa do pretenso futuro deputado. Ao vê-lo, o político preparou-se para mais uma facada. Devido ao alto volume de despesas com a campanha, seu caixa já estava quase zerado. O pidão acercou-se devagarzinho, como quem não quer nada, e deu o bote:

- Deputado, estou aqui para lhe pedir um favor. Sei que o senhor já fez muito por mim, mas não tenho a quem apelar... Minha mãezinha, deputado, teve de se operar... Surgiram uns problemas na mesa de cirurgia, ela não resistiu e morreu... Vim aqui pedir que o senhor pague pelo traslado do corpo. Nós gostaríamos muito que mãeinha fosse enterrada aqui em Boa Vista.

O candidato coçou a cabeça, olhou para um lado, depois para o outro, pigarreou e falou:

- Meu filho, se a situação estivesse melhor eu até ajudaria. Minha campanha está saindo mais cara do que eu tinha pensado. Estamos raspando o fundo do nosso caixa.Concluindo: não vai dar para trazer sua mãe, não... – e virando as costas - Até porque ela nem vota mais...

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Aroldo Pinheiro
Enviado por Aroldo Pinheiro em 07/03/2011
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