SABEDORIA DE AVÓ

Minha velha avó, cozinheira de mão cheia, fazia doces como ninguém. Pamonha, brôa, pão de queijo, bolo de milho, bolo de mandioca, bolo de chuva, pão, rosca, petas, sequilhos, biscoitinho de nata. Nunca me esquecerei dos bolos de aniversários, de três andares, confeitado com glacê duro sabor limão, colorido e enfeitado com rosas pitangadas com arte, todas comestíveis, era o presente mais esperado do ano. O arroz com feijão dela dispensava qualquer outro acompanhamento, ai que saudades... Era em cima do armário da cozinha que, em latas, ela escondia os doces cristalizados e os papos de anjo ficavam, nas compoteiras, camuflados atrás dos copos...era nossa maior cobiça, ficávamos querendo comer essas guloseimas antes da hora, depois de corrermos livres, feitos loucos, o dia todo. Será que tem coisa melhor que comida de avó? Não, na infância nem a comida da mãe é melhor.

Vovó era elegante, mesmo estando gorda, tinha porte de uma grande dama: sempre com os cabelos arrumados; o talco fino, passado com esponja de pluma, no pescoço branco; olhar de princesa. Ensinava com doce serenidade e tinha o hábito de ficar com os cotovelos no peitoril da janela , no fim da tarde, aguardando vovô retornar da lida. Mirava o horizonte com olhos distantes, enquanto enchia as bochechas de ar para depois espocá-las apertando cada lado com o dedo indicador. Era engraçado o barulho que fazia. Não foi mulher de pouca luta, não pôde estudar muito, mas tinha uma cultura vasta. Passados tantos anos que ela se foi não é bem sua imagem que me vem à cabeça e me povoa de imagens divertidas, como quando eu fugia dela correndo, e, ela atrás fingindo que me perseguia, tendo na mão uma revista Cruzeiro dobrada, na qual batia a própria mão e ameaçava: "Ah, menina, tô te guardando!" Fazia mais estardalhaço que medo. Dela, no meu agora, o que me vem são as frases que repetia em determinadas circunstâncias, eram de rica sabedoria. Uma delas usei para comentar um texto de uma amiga - Tania Orsi Vargas - hoje, aqui no Recanto: "À DIREITA VOLVER!!!" Não pensei que o que ela dizia e que a gente nem pensava que escutava fosse ficar tão gravado na memória, para só muito depois haver aplicação e admiração tardia. Como é bom ter avó, como é rica essa convivência embora a gente nem se dê conta no momento certo. E as palavras que me fazem escrever com gosto não me dão ganho, sou escritora amadora, amo escrever, amo mais que demais. Essa é uma forma de ser livre para poder ousar. É como Vovó dizia: "Quem dá pão não dá poder!"