nós arquitetos, odiados!

Para explicar o ódio aos arquitetos, temos que distinguir arquitetos educados dos não educados. Tal educação a qual me refiro não vem do curriculum escolar propriamente dito. O interesse pelas artes , cinema, teatro, balé, pintura, escultura, música, literatura e pela arquitetura não se aprende em sala de aula, mas sim na vivência do dia a dia, na dedicação e interesse por estas disciplinas, no acompanhamento da atividade cultural. É a vocação pelo descobrimento das causas e efeitos dos fatos, da obra. É curiosidade cultural e também científica, é a busca pelo significado intrínseco das coisas. A literatura talvez seja, das artes, a mais importante para o arquiteto. O exercício intelectual provocado pela leitura, estimula a criatividade e facilita o raciocínio geométrico, exigência crucial para o exercício da profissão. Oscar Wilde, esteticista do século 19, personifica Dorian Gray com uma beleza incomum, educação e inteligência, mas uma vida duvidosa para os costumes da época. E mesmo assim ditava como se usar o cachecol, fazia sucessso com o modo de se vestir, criticava as artes e era imitado e odiado ao mesmo tempo, tanto que o autor de Retrato de Doryan Gray, relaciona o seu herói com Petrônio que, segundo a lenda, nas suas últimas horas após ter iniciado o suicídio, escreveu Satiricon com o próprio sangue que escorria vagarosamente de suas veias. Petrônio nada mais era do que um arbiter elegantiarium junto ao Imperador Nero. Conselheiro do bom gosto, dos bons costumes, da elegância, nas artes e na gastronomia, provocando inveja e ódio aos outros conselheiros, principalmente de Tigelino, prefeito de pretório e poderoso conselheiro de Nero.

Caluniado e injustiçado, Petrônio foi preso e cometeu suicídio. E os arquitetos? Longe de cometer tal ato letal, somos pelo menos odiados. Hoje elaboramos os espaços tão valorosos e provavelmente definitivo nas vidas de muitas pessoas. Virou mania, arquiteto gosta de cozinhar e beber vinho. Escolhemos as cores, definimos onde colocar os objetos de arte, as vezes criamos locais especiais para eles. Quantas vezes não acomodamos genro e sogra na mesma casa? Um salto da inteligência para a vida angelical. Escolhemos os móveis, definimos o estilo do adolescente no seu quarto – underground, roqueiro, etc. Criamos a alcova, com ou sem espelho. Somos obrigados a conhecer o cotidiano da família e acabamos por opinar em algumas coisas não mais como arquitetos e sim como amigos. Indicamos filmes, compositores, cantores, espetáculos e até dicas com filetar um azeite com trufas negras em um omelete de cogumelos de paris, servido é claro com um belíssimo chardonnay sem madeira, daqueles bem frescos explicitamente com notas de maças verdes.

E o ódio? Hoje com 57 anos, casado, três filhos adultos tenho notícias dos comentários irados sobre minha influência numa família:

- Garanto que este quadro foi idéia do idiota do arquiteto

- tenho certeza de que aqui a churrasqueira ficaria bem melhor!

- Garanto que a receita do filet e o malbec foram indicação daquela bichinha! – diz o cunhado.

Desculpem-me, as vezes eu me perco e fico arrogante.

puccinelli
Enviado por puccinelli em 09/06/2011
Reeditado em 19/06/2011
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