Clichê cotidiano

Um homem em frente a um computador desligado; braços apoiados na escrivaninha e mãos trêmulas entrelaçadas em frente ao seu rosto. Um cigarro queima no cinzeiro ao lado, e a espessa fumaça torna ainda mais turva sua maneira de ver o seu próprio reflexo no monitor desligado.

Se a vida dele fosse roteirizada, esta seria a mais marcante cena de seus parcos 28 anos de vida. Uma situação banal, clichê e, à primeira vista, sem qualquer essência; era até mesmo risível, não fosse sua complexidade emocional. Mais do que o relato estereotipado de qualquer escritor sem ideias, a situação deixava transparecer o desespero daquele que encontra no próprio olhar a expressão mais nítida do vazio, do não-estar e da mais genuína caracterização do fracasso.

O medo de perder deu lugar à dúvida de não conseguir conquistar. O único êxito passou ser a perda de conquistas, além das infindáveis lágrimas de raiva, ódio, remorso e tristeza. Porém, naquela noite ele não pôde vencer. Restaram apenas os clichês como consolo: secos, viscerais, sem qualquer lágrima para expressar a liquidez dos sentimentos. Naquela noite, a dor foi sua única amiga.