Utopia e torpor

Wilson Corria

A segunda-feira preguiçosa abriu um sol de torrar amendoim.

Utópico da Silva pulou da cama após a mãe dar dez cutucadas.

Banhou-se. Escovou os dentes. Penteou o cabelo. Perfumou-se.

Pôs a cueca verde. Vestiu a calça azul. Entrou na camisa creme.

Fez o café. Vestiu a mochila bege. Abriu a porta. Ganhou a rua.

Deu um passo. Dois passos. Três mais. Andou até o Collegium.

Meteu o olho na lente do computador. Identificou-se. E entrou.

A aula era Educação Física. Passou por guardas. Pisou na pista.

A professora estava na dela. Ele abriu o caderno. Que inferno!

Para se mexer, tirou só a roupa de inverno. E se fez aluno leve.

A professora deu a instrução. Ele se misturou ao pelotão. +um.

Ele pôs o pé no ponto. O olho na marca da chegada. Correção!

Quem chegará primeiro? Quem chegar é que será o campeão.

O prêmio não era nada ruim: “Dez onças pra ele, ou pra mim”.

Correu como elástico se estica até o último nó. E suou a pão!

E não é que seus outros nove companheiros ficaram para trás?

Utópico da Silva acelerou. Venceu. Enfim, o grande campeão.

Foi só subir no pódio e lá estava ele. Feliz. Dez onças na mão.

Silva desceu das tamancas. E abraçou os nove companheiros.

A cada abraço dado, uma onça era deixada. Só uma lhe restou.

Então a tal da professora que vivia na dela o apertou pra saber:

– Por que as onças foram todas dadas? Não ficaram com você?

Ao que Utópico da Silva alimentou o respiro. Quis esclarecer:

– Negativo... Pelamor!!! Sem eles, como eu seria o ganhador?

Era sol de segunda-feira. O mundo continuava em seu torpor.