A MOÇA NA IGREJA

Entrava raramente naquela capela, mas, naquele dia, especialmente, sentiu que precisava entrar. O coração remoía mágoas e preocupações que não iriam sarar por si. Sentia que aquele lugar meio escuro, misterioso, pacífico, - perfeitamente aconchegante, como o útero materno – iria ajudar-lhe a organizar o pensamento.

Entrou, sentou em um dos bancos, bem atrás. Não sentia vontade de sentar-se mais à frente. Olhou para as paredes bonitas da capela, o teto elaborado, pensou, “que bom poder estar aqui, sinto-me protegida, sinto-me como em uma concha”. Teve a estranha sensação que seria perfeito se pudesse passar o resto de sua vida ali, protegida do mundo. Poderia esquecer-se para sempre de todos os seus problemas, e começar uma nova vida naquele lugar, naquele mundinho hermético, abençoado. E isso que não era, de maneira alguma, uma pessoa religiosa. Acreditava em Deus, mas não era uma praticante fervorosa de sua religião.

Tinha notado uma mocinha a seu lado, que deveria ter uns vinte anos, com a cabeça baixa, rezando. Pensou na moça, “O que será que a traz aqui? Será que, assim como eu, está com o coração inundado de problemas e precisa de ajuda?”. A resposta logo vem: a moça começa a chorar desesperadamente, soluçando, um choro baixinho, mas forte, daqueles que vêm do fundo da alma.

Ela olha, sem jeito. Não sabe o que fazer. Lembra da filha adolescente, fica com um nó no espírito. Quer chorar também. Quer conversar com a moça. Fica alguns minutos (que se arrastam parecendo horas) tentando lutar contra a sua vontade de se aproximar da moça, conversar, ser mãe, como sempre é, como sempre vai ser. Respira fundo, chega mais perto. Coloca a mão no ombro da menina, que joga-lhe um olhar assustado. “Meu bem, seja qual for o seu problema, não se preocupe, há de passar”. Surpreende-se com as próprias palavras. Não é uma mulher muito acostumada a tais gestos, não é muito de conversas delicadas. É uma amiga exemplar, amiga para todos os momentos, mas costuma dar conselhos práticos àqueles a quem ama. Pensa, “Nossa, quem é essa pessoa que agora surge em mim e consola uma absoluta estranha chorando em uma igreja?!”.

A moça pára um pouco de chorar. Ela continua com a mão em seu ombro, dizendo tudo que a moça queria ouvir naquele exato momento, naquela igreja, naquela manhã de chuva fina em plena primavera. Ela pergunta o nome da moça. A moça pergunta o seu. Não são mais tão desconhecidas. Têm agora algo a dividir, pelo resto de suas vidas. O encontro na igreja. A certeza de que nunca mais estarão sozinhas.

Clarice Casado
Enviado por Clarice Casado em 03/02/2005
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