Como uma droga

COMO UMA DROGA

Eu preciso correr. Já tem um minuto que eu precisava ter saído. E ainda nem escovei os dentes. Enquanto isso vou juntando os papéis. E minha filha vai pegando a chave do carro. Ao sair, esqueço de trancar as portas, mas não volto, estou tão atrasada! Os clientes aguardam ansiosamente o projeto. E o sinal fica vermelho. Nessas horas tudo parece atrapalhado. Noto meu cabelo despenteado e a roupa desajustada. O trânsito, óbvio, lento. Ligo o rádio, mas não consigo encontrar uma boa estação. Desligo. Na verdade, não tive paciência para encontrar uma música agradável. Até porque nada poderia me agradar naquele momento. Avanço em primeira. Logo estou a oitenta quilômetros por hora, cruzando avenidas, buzinando. O suor escorre pela testa e o escritório fica ainda a alguns minutos. Sem saber porquê, lembro que esqueci de deixar o jantar da Claudinha. Mais uma vez. Coitada, chega tão cansada do cursinho... Preciso mudar esse estilo de vida logo. Já não recordo qual a última vez em que me sentei para ver TV com os meus filhos. Sem que o telefone tocasse ou estivesse com pressa. Isso não é qualidade de vida... Droga, não tem onde estacionar! Paro há alguns quarteirões e pego minhas coisas, depois de derrubá-las centenas de vezes. Logo mais volto para trancar o carro. E então corro acelerado, sem olhar para os lados. Chego ao prédio e sou avisada de que esperam por mim. Lá vou eu, preparada. Os acionistas me olham. Penso se estaria parecendo uma louca. Sorrio e começo a falar. Logo os convenço de que trabalhar com a nossa empresa é a melhor opção. Ouço um elogio e me apronto para o dia seguinte. Como uma droga.

Milena Verri
Enviado por Milena Verri em 26/03/2007
Código do texto: T427030