Fica com ele, amigo!
Desde que vim morar na serra não compro jornal nas bancas. Quando a gente compra o jornal impresso, sente-se na obrigação de lê-lo quase inteiro. É mais uma questão de custo-benefício do que da própria vontade. Na verdade tenho lido notícias online, mas sinceramente, raramente passo das chamadas. Internet a gente paga por mês e tem tantos outros benefícios que as notícias representam uma pequena parte desse todo que pagamos.
Hoje eu resolvi voltar aos velhos tempos. Sabe aquele ritual de acordar, ir na banca da esquina, comprar o jornal e depois sentar no balcão da padaria e devorá-lo junto com o pãozinho e o pingado? Foi o que fiz. Sentei confortavelmente, vieram amigos bater papo e eu falava apenas bom dia, sem tirar os olhos das notícias. "Ministros e secretários recebem diárias de viajens irregulares." ; "Explosão de teatro em Paris, deixa sete feridos." ; "Presidente da caixa vai ser intimado a depor." ; "Corpo de missionária americana será velado em Altamira.". Meus amigos se cansaram de esperar e formaram um grupinho de bate-papo informal, tomando café, rindo... E eu ali, debruçado nas notícias, pingadinho esfriando e o mau-humor esquentando com as manchetes.
Foi quando chegou um turista e me perguntou se poderia dar uma olhadinha no jornal. Já dominado pelo instinto metropolitano das grandes cidades, ia dar uma resposta mau-humorada quando olhei em volta, vi araucárias e plátanos emoldurados pela janela, meus amigos alegres e felizes naquele bate-papo gostoso e "irresponsável". Nem precisei pensar duas vezes:
- Pois não, meu amigo. Pode ficar com ele que eu já li tudo.
Saí rapidinho, antes que ele desistisse da idéia e começasse a comentar as notícias comigo. Peguei o pingadinho e meu pãozinho com manteiga, levantei e fui até a rodinha animada. Falavam sobre o investimento que o Lázaro fez no seu pesqueiro e quando eu cheguei, um deles me perguntou:
- E daí? O que tem de bom no jornal de hoje?
Eu disse:
- Nada importante não... Mas o que mesmo vocês estavam falando do pesqueiro do Lázaro?
Dei uma olhadinha de "rabo-de-olho" no turista. Ele estava lá, virando página por página, sobrancelhas em " V ", pingado esfriando e pãozinho amolecendo.
Respirei fundo e, já rindo, voltei meus olhos para a turminha. Mesmo sem saber do que se tratava o novo assunto, se o sorriso não fosse por ele, seria pela redescoberta da felicidade.
.
RSanchez 13/02/2005 12:00:21