Estátuas peludas de sal

Um homem, dois cachorros e uma caçamba de materiais recicláveis, puxados pelo cansaço, param molemente no posto de gasolina. O rapaz dá um longo suspiro. A caçamba suspira. Os cães têm suas línguas a beira do chão.

-Posso usar o banheiro? - suplica o catador ao frentista, que rapidamente assente com a cabeça, torce o beiço e lhe dá um muxoxo.

Os animais ameaçam acompanhá-lo ao mictório, mas há um dedo em riste bem no meio do caminho.

-Fiquem bem quietos aí!

Eles obedecem petrificados. São duas estátuas de sal peludas e pulguentas coladas no cheiro de combustível: não respiram, não piscam. Tudo é espera.

Eu me afasto devagar do quadro com a certeza de que presenciei a tradução mais literal e poética de uma obra.

(Maria Shu - 17/12/14)

Maria SHU
Enviado por Maria SHU em 17/12/2014
Reeditado em 07/09/2016
Código do texto: T5072987
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