Briga de Touros

Roda de chifres circulando o piquete. Quatro touros, pelagem negra, aptidão única para cem por cento positivos na cobertura.

Renome e nome jogados no centro da roda de campeões. Um único destino.

Toda briga de touros traz a marca indistinta da morte em seu bojo.

De criança sempre soube de sua existência pelas marcas dos chifres nas costelas de um peão e de seu cavalo imóvel, face ao violento ataque.

Os touros assim como os homens por vezes caminham por trilhas preestabelecidas. Alisadas, escritas, descritas pelos desígnios humanos até que certa manhã de domingo decidem que é dia de sair do script.

Caminhando lentamente como fazem os soberanos, olhos atentos aos adversários, assim é o inicio do embate. De um relance batendo a pata dianteira com força no chão é possível sentir distância o tremor na terra arenosa.

Não me lembro dos passos de um touro nos dias de trégua bovina por que não se ouve. São os silêncios da campina, deslizando sobre o braquiarão mansos, mansos. São a lembrança de que a vida segue seu rumo sem que seja sempre preciso lutar mas que seja sempre necessário estar preparado para fazê-lo.

A noite encontrou estes bravos guerreiros ainda em suas atividades circulares de demarcação de território e demonstração de força. Chifres esfolados nos cupinzeiros, terra vermelha espalhando-se para o alto pelo poderoso movimento das patas, esturros que se ouvem sucessivamente a considerável distância.

Em noites assim não se ouvem pássaros noturnos. As águas escorrem silenciosas pela campina e até a parda acostumada a reinar ao ouvir de longe os bravios de corcovas negras se afasta. Não se atreve que sua natureza diz que está no topo da cadeia alimentar, mas na prática não é bem assim.

Os touros vão além da cadeia alimentar. Deveriam ser chamados de reis, pois entre eles não há patrões. Nem tomam conhecimento de que sejam objetos, propriedade de quem quer que seja. Apenas fazem aquilo que seu instinto os impele a fazer, existir em sua magnitude e verdade de gestos.

De tempos em tempos um ataque frontal. Empurrões, chifradas, o circulo se fechando aos poucos, os passos um pouco mais rápidos. O som dos esturros sucessivos marcando o tempo, a cada minuto mais curto para o ataque final.

De repente um ataque triplo a um único adversário que se debate, mas não desiste até o último segundo de vida, sua vida que o abandona rapidamente após sucessivos esturros dos três brutos que se afastam respeitosos.

Está terminado.

Tânia Gauto

21-06-2015

Para os quatro touros que lutaram esta noite e principalmente para o touro negro que morreu por causa do peão que não conhece bem a lida do gado e os deixou no mesmo piquete.