CRÔNICAS DO TREM: DIVERSÃO

Sou definitivamente old fashion. Acho o silêncio que domina os trens de hoje algo sepulcral. Dá até saudades dos gigantescos aparelhos de som que os antigos jovens carregavam junto aos ouvidos no último volume.

Hoje a coisa é tão impessoal que a toda hora se escuta o aviso:- “É proibido o uso de aparelhos sonoros sem o uso de fones de ouvido.” Com a minha vocação de estar sempre nadando contra a corrente, não os uso! Canto. Baixinho. Mas como me olham feio...

Podia até desconfiar dos meus dotes musicais, se não fosse o fato de que o mesmo olhar atinge todo mundo que conversa. Parecem dizer:

-“Porque vocês não usam o facebook ou o Messenger como todo mundo?”

Amo quando venho do lado de uma turma de cinquentões que vêm a viagem inteira (duas horas) conversando sem parar. Infelizmente um dia me empolguei e tentei participar. Esqueci que eles são apenas pessoas normais nesse mundo louco. Contei uma estória antiga e eles pensam que eu trabalho no IML, quando na verdade sou enfermeiro e tento todo dia evitar que se enviem corpos para lá. Me tratam meio como um intocável indiano. C’est la vie!

Hoje os encontrei. Me cumprimentaram com o costumeiro asco. Fiquei na minha, os escutando e rindo por dentro. Mas acabei gargalhando quando uma contou como trabalhou a semana inteira para fazer o cabelo do jeito que queria. Horrível por sinal. E a cada tentativa da cabeleireira de fazê-la mudar de ideia dizia:- “Faz do jeito que eu quero! Tô pagando!”

O mais galhofeiro da turma disse:

-“Olha, divertiu até o carregador de defunto!” Respondi:

-“Camarada, vou me divertir no serviço? Tenho que me divertir com a vida!”

Aristoteles da Silva
Enviado por Aristoteles da Silva em 29/02/2016
Reeditado em 02/03/2016
Código do texto: T5559366
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.