SEMÁFOROS E CHUPA-CABRAS

A capital da Bahia crescera aceleradamente na última década, mas sofrera horrores sob o domínio de governos municipais que não cuidaram muito bem de acompanhar a ampliação das ruas e avenidas em sintonia com a velocidade de crescimento da população e do número de autos que passaram a integrar a frota de veículos da cidade; e, como imediata e drástica consequência, vejo uma chuva de problemas para quem tenta atravessar ruas e avenidas sem passarelas ou para quem precisa nelas se deslocar em veículos de particulares ou em coletivos, principalmente nos horários de rushing, onde aflora o fator comum da falta de segurança para quem está dentro e para quem está fora dos veículos, sabidamente em número muito elevado e, portanto, incongruente com a capacidade das vias de escoamento na bela e encantadora capital da Bahia.

Soluções milagrosas, milagreiras ou milagrentas foram dadas por técnicos da Prefeitura Municipal de Salvador, principalmente em cruzamentos de avenidas, tais como o da avenida Garibaldi com a avenida Vasco da Gama, o do Iguatemi e o do Makro, reduzindo o tempo em que a luz verde permanece aberta para ambos os fluxos que se cruzam perpendicularmente naqueles locais. Trataram, pois, da busca do péssimo ou do emprego de avançadas técnicas matemáticas de pessimização ao tráfego, uma vez que um maior número de vezes por hora a velocidade dos fluxos de autos vai a zero, de sorte que a velocidade média fica menor e um maior tempo de permanência dos veículos nas ruas e avenidas sinalizadas passa a engordar os quilométricos engarrafamentos, doando-se aos motoristas uma dose extra de stress que bem poderia ser evitada à luz de técnicas e tecnologias adequadas para combater este tipo de problema: construção de passarelas, túneis e ou viadutos em consórcios com empresários, que teriam participações nos empreendimentos recuperadas através da cobrança de pedágios, como normalmente se procede no exterior.

Não há dúvida de que, quando se doa bom serviço à população, esta não se contrapõe ao pagamento de taxas justas para usufruir a vantagem, apesar desta colocação não gozar da unanimidade de populares. Todavia, junto ao homo sapiens, bem verificamos que todo consenso é quase sempre estúpido!...

Observo outros erros elementares e sei que também são repugnados pelo soteropolitano, perturbado ou atordoado por não encontrar alternativa para escoar os veículos em determinados lugares de Salvador, localizações que não passaram por planejamento prévio e que quase sempre representam bairros importantes desde antes da expansão residencial da cidade.

São muitos bairros novos, sendo o Itaigara onde moro um exemplo marcante de concessão de alvará para construir prédios que, muitas vezes, destinam-se a abrigar dezenas ou até centenas de famílias, sem contudo ter sido vinculado ao mesmo o correspondente número de habitantes, bem como a quantidade de automóveis a circular nas vias e/ou ruas de acesso aos condomínios servidos pelas necessárias vias públicas para o fluxo ou escoamento no dia a dia de normalidade de uma grande cidade.

É com pesar que diariamente assisto ao esforço que famílias habitantes do Itaigara fazem para deslocar-se nos próprios veículos particulares; e, este descontrole ou instabilidade no sistema de trânsito é também uma contribuição ao aumento da probabilidade de batidas e de acidentes no trânsito, muitas vezes com vítimas.

Percebo com clareza que o custo de não se planejar é muito alto e isto se dá sobre todos os aspectos e, certamente, o resultado para a cidade é negativo e, por conseguinte, para o próprio estado baiano.

Soma-se ao problema antes posto o comprometido asfalto das ruas e avenidas de Salvador, o qual está deteriorado e já perdeu sua base de suportação em muitos trechos, cujos buracos se transformaram em dor de cabeça para os motoristas por reduzirem a vida média dos pneus, suspensão e outras partes dos autos, o que também se verifica com mais intensidade durante os períodos chuvosos, quando buracos ou crateras são sempre reincidentes e têm aberturas nas vias de maior tráfego, impondo condições de risco para os motoristas mais descuidados, que acabam por cair acidentalmente naqueles enormes vazios que enfeiam a regularidade de qualquer asfalto.

Como estamos no mundo neomoderno, sinto na pele que sofremos por aqui com a aplicação das tecnologias avançadas e desenvolvidas especialmente para lugares civilizados e de maior grau de desenvolvimento socioeconômico, mesmo porque somos dependentes deles e também sofremos ao sermos manipulados ou meramente usados para catalisar o imperialismo daqueles que globalizaram a Terra a seu favor. Assim, como num passe de mágica, descubro que um dos maiores responsáveis por acidentes e mortes no trânsito é o problema da alta velocidade praticada na terra tupiniquim. Puxa, como não pude ver isto antes!?

Não demorou que multas elevadíssimas fossem inseridas no Código Nacional de Trânsito para quem ultrapassar alguns limites de velocidade máxima. Surpreso, vejo que não existe multa para quem anda devagar, abaixo de 80 km/h e acima de 40 km/h, comprometendo a eficiência do escoamento da frota da cidade.

Logo se chegou à necessidade de instalação de mais semáforos (sinaleiras, como são conhecidos em Salvador) para emperrar o trânsito e/ou para atender a passagem de pedestres ao acessar empreendimentos recém-inaugurados por consequência não-desejada do aumento da demanda comercial daqueles sinalizadores, cujos projetos não tenham contemplado passarelas ou túneis nos pontos junto a avenidas ou ruas de rolamento, numa desmedida contribuição ao aumento dos homéricos engarrafamentos de que a cidade de todos os santos há muito padece.

Cito o famigerado semáforo em frente ao novíssimo shopping localizado na área do antigo Aeroclube de Salvador: sem dúvida, um retardador da velocidade média do trânsito ali, que uma simples passarela de pedestres poderia evitar sem maiores problemas, coisa que deveria ser bancada pelos empresários que construíram tamanho interessante empreendimento naquele esplêndido ponto da orla de Salvador, até mesmo desfigurando principalmente a linda paisagem e muito contrariando ecologistas e ambientalistas baianos. Mais adiante, a cerca de menos de um quilômetro daquele local, como se não bastasse a agressão ao tráfego naquela região da orla marítima, mais um semáforo em frente à sede do Sport Clube Bahia: ó Deus, que tortura!

Como o problema da instalação dos semáforos corrobora para reduzir a velocidade média dos veículos e, por conseguinte, implica em maiores e piores engarrafamentos nos quatro pontos cardeais deste lugar que é patrimônio da Humanidade, os motoristas passaram a andar com velocidades mais elevadas quando guiam veículos, numa tresloucada tentativa de compensar as perdas advindas dos impróprios semáforos já abordados aqui. Pelo projeto de concepção e pela maquiada conservação das ruas e avenidas, não é difícil se cenarizar para uma elevação do número de batidas e acidentes em todos os lugares em que o trânsito significa baixas velocidades médias dos autos, fazendo com que os motoristas pisem mais fundo no acelerador.

Numa típica ação feedback dos responsáveis pelos interesses municipais e apoiados no ora vigente Código Nacional de Trânsito, fotossensores foram instalados em pontos de maiores velocidades para punir todo aquele que ultrapassar os baixíssimos limites de velocidade estipulados pela atual legislação brasileira de trânsito; e, assim, estão tentando consertar o efeito e não a causa geradora do problema, todos estão, pois, assinando terrível incompetência em resolver problemas.

Relembro que quando do projeto de Brasília, Oscar Niemeyer havia pensado a capital do país sem semáforos, mas a técnica perdeu para o comercial e, após este fato deplorável, do tempo da maldita administração dos militares golpistas, grande parte dos semáforos fora vendida ali e muito mais no resto deste país! Vejo, pois, que a cultura praticada cá pode ser resgatada onde um dia nós acreditamos ter a cidade mais bem projetada do mundo. Coube, entanto, ao Lúcio Costa a dor pelo uso inapropriado de seu projeto pelas autoridades brasileiras, representadas por potentes beócios de bem conhecidas e marcantes ações políticas e outros por mera incompetência técnico-gerencial, fatos do baú das represálias da ditadura militar que escaparam ou foram oficialmente revelados à nação e, justo por isso, são do conhecimento de todos hoje em dia, na liberdade que voltou a brilhar no Brasil.

Vão ficando os buracos e o milagre da multiplicação dos sinais, quando o número de acidentes parece acompanhar o tamanho da frota de veículos numa velocidade ainda maior.

Com tantos fotossensores espalhados pela cidade, passei a ter cuidado maior com o perigo do esquecimento sobre a localização dos famigerados fiscais inanimados, tão ridiculamente apelidados de “chupa-cabras”, como uma coisa que detesto e que a população abomina, apesar de saber que o trânsito de Salvador precisa ser melhor disciplinado. Entretanto, entendo que precisa crescer com os erros de décadas ora revelados pela explosão demográfica experimentada pela não bem planejada cidade-verão; e, sem dúvida, sinto que precisamos, com urgência, responsabilizar e banir dos órgãos públicos onde atuam incompetentemente todos aqueles que nos têm imposto agruras – e até traumas – no caótico trânsito de Salvador.

Será que alargamentos de ruas ou novas avenidas haverão de solucionar os congestionamentos decorrentes do grande número de veículos no trânsito, uma vez sabido que em São Paulo êxito não fora logrado com tais medidas e todas as tentativas de parar os motoristas têm resultado em insucesso, para tanto não bastando nem os muitos viadutos e passarelas para pedestres ali observados? E o que de fato deve ser feito para pôr fim nos insuportáveis, gigantes, neurotizantes e cotidianos engarrafamentos de nossa belíssima Salvador?

Salvador, 25 de julho de 1999.

Oswaldo Francisco Martins
Enviado por Oswaldo Francisco Martins em 01/05/2016
Reeditado em 01/05/2016
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