Carro roubado

O velho Tempra do tio Carneiro vivia sempre reluzente.O carro era uma espécie de família, de que ele cuidava com todos os mimos. Carro limpo, aromatizado... Mas o homem não era ciumento, possessivo e se deliciava com a companhia dos sobrinhos e de amigos, a quem costumava dar carona. O que ele gostava mesmo era dos elogios. Quando falavam bem do carro, era como se elogiassem alguma de suas virtudes.

E tudo isso sem nenhum seguro, até porque o proprietário era homem de muita fé e entregava para Deus...

Todos os dias, saía ele de casa e – já aposentado – pegava o carro e ia cumprir alguns trabalhos nas redondezas, onde, geralmente, vendia roupas ou intermediava aluguéis de imóveis, cujos proprietários não moravam mais no subúrbio onde acontece esse relato – um cantinho simples de Juiz de Fora, cujo principal ponto de referência para os estrangeiros era o antigo Hospital Aragão Villar, hoje desativado.

Um belo domingo, tio Carneiro inicia-o com a rotina de ir à missa das sete. Apronta-se e dirige-se ao estacionamento. Libera, com sua chave de cadeado, o portão grande e vai para a vaga de garagem, onde vivencia um assombro. Vaga vazia... Ato contínuo, lança os olhos às demais vagas e nada do Tempra. Não havia dúvidas...

Corre para casa – o homem não usava celular – e liga para as autoridades policiais, que, contrariando as expectativas, acorreram diligentemente ao local do sinistro. Tio Carneiro explicou o que acontecera, deixando o policial intrigado, uma vez que o tio encontrara o portão fechado e os outros carros protegidos em suas garagens.

– Estranho, parece coisa encomendada! Queriam o Tempra e tinham a chave – sentenciou o policial.

– Me ajudem... Dou-lhes uma recompensa se recuperarem o carro – desabafou o tio Carneiro, visivelmente consternado.

A polícia se foi e tio Carneiro entra no carro de um dos sobrinhos para fazerem uma diligência pelas redondezas. Seguem rota contrária à das policiais. Viajam por algumas ruas. Todos, ansiosos, buscam pelo Tempra verde... Mas nada... Até que...

– Vejam, tio, o carro está lá em frente à padaria! – exclamou Bruninha.

– Deve estar todo depenado! – sentenciou o sobrinho João Pedro.

– Nada disso, meninos, ontem à tarde vim de carro à padaria e voltei a pé pra casa.

– Tio, mas você esquecer o carro? – disse a menina.

– Pois é... São essas receitas médicas. Exercícios, andar, andar sempre. A gente fica com isso na cabeça e não quer perder oportunidade. Me esqueci completamente do carro.

Tio Carneiro despediu-se, saiu correndo, entrou no Tempra, olhou o relógio e viu que ainda dava tempo de assistir à missa das dez...