O telegrama

Leio, no impagável “Minhas mulheres e meus homens”, do cronista Mário Prata, o caso daquele radialista que foi chamado a apresentar lá em Lins os times de futebol, numa partida em que o São Paulo jogaria contra a equipe da casa.

O locutor – com voz tonitruante e pausada, expressão do Prata – nomeou os atletas, e depois foi a vez do árbitro, o senhor Telêmaco Pompeu, identificado alto e bom som como Telemáco. A torcida foi abaixo; informado do erro, o homem voltou ao microfone e, sem perder a pose, corrigiu-se: - Retífico...

O fato narrado me levou lá para o antigo ginásio, quando este – que hoje ousa até mesmo escrever de vez em quando – estudava na Academia de Comércio, colégio de padres e de bons professores, os quais costumo citar nessas andanças pela escrita.

Dionísio ensinava português. Conhecedor, inteligente, o mestre procurava nos cativar com alguns casos, que iam entremeando a aula e nos divertiam... Homem reverente aos mestres, anos depois – quando já caminhávamos para o ensino científico – Dionísio dizia-nos que tínhamos que caprichar na aprendizagem, pois na série seguinte estudaríamos com o Mário Roberto, que, por sinal, era professor dele na faculdade. E nos deixava aquela expectativa de conhecer o professor do nosso professor, a quem Dionísio atribuía todas as honras, que o futuro não desmentiria.

Mas voltemos ao primeiro ano de ginásio na Academia. Dionísio falava das sílabas e da tonicidade das palavras – essas coisas que criança nem sempre entende o porquê de estudar. Eis então que ele conta um pequeno caso para mostrar como era importante marcar direitinho a tônica das palavras e acentuá-las segundo as regras.

Aconteceu no interior de Minas. Possivelmente em Viçosa. Dionísio é de lá e atualmente – creio eu – continua escrevendo para o jornal local a história da sua gente. O caso é que lá viviam dois irmãos, que eram unha e carne. Um não vivia sem o outro. Lembro-me de que o mais novo tinha o apelido de Fisico. O mais velho, na falta do nome exato, vou chamá-lo de Dinho. E a história, que mal começa, já está quase acabando...

Ocorreu que Dinho teve de vir para Juiz de Fora prestar o Serviço Militar. Veio triste o menino, com muitas saudades do irmão – mais até do que dos pais, por motivos que irmãos que se amam, bem sabem. Os pais,humildes camponeses, aceitavam com sofrimento a ausência do filho, mas Fisico padecia.

Submetido aos exames regulares, Dinho não foi aprovado no teste de aptidão física. O garoto, que ficara na casa dos tios, preparou, feliz, as malas e telegrafou ao pai: - Papai, não posso ficar; falta físico. O pai, ato continuo, sapecou a resposta: - Fica filho, Fisico vai na semana que vem.

Gargalhamos, e a aula seguiu seu rumo...