BOEHME (Theosophia) e HEGEL (Filosofia)

Jacob Boehme, o expoente máximo da Theosophia obtida por um Ser Humano, o sapateiro alemão a quem, praticamente, todos os mistérios de Deus foram revelados, os quais, de tamanha magnitude e extrema profundidade, jamais foram alcançados e jamais compreendidos integralmente por quaisquer outros mortais, ainda que decorridos 392 anos desde sua morte. Podemos conjecturar, que somente uma evolução espiritual compatível com a de Boehme poderia possibilitar a sua inteira compreensão, mas isso não depende da deliberação do Ser Humano, pois é concessão, cabendo-nos, todavia, o maior interesse em obtê-la, o que exige muitos esforços nos estudos adequados à pretensão.

Georg Wilhelm Friedrich Hegel, também alemão, Professor Universitário de Filosofia, formado também em Teologia, foi um dos maiores nomes entre os filósofos do fim do século 18 e início do19, um período muito fértil dessa ciência, especialmente na Alemanha. A formação teológica e filosófica de Hegel, o conduziu aos conflitos entre a metafísica e o racionalismo, produzindo um estilo literário pesado, oscilando entre ambos os conhecimentos, quando sustenta que a razão é o fundamento da existência, e, em contraposição, a idéia que existe um sentido em tudo o que acontece no mundo, cujo sentido é a expansão do Espírito, caminhando em direção ao Absoluto. Neste caso, parece que ocorreu a fusão do Teólogo com o Filósofo (“Teófilo”) e, um degrau acima, poderia ter provocado o surgimento do Teósofo, que seria a definição da ambigüidade de Hegel. Vejamos onde Boehme e Hegel mais se aproximam.

“Escrevi unicamente para aqueles que buscam, e não para os astutos e sofistas, para os quais nada tenho a dizer”, diz Boehme, tendo em vista que toda a doutrina Cristã resume-se na instrução do Espírito, e de como o homem pode ser o habitáculo do Reino de Luz, tendo-o dentro de si mesmo. Essa fonte do poder Divino expõe a substancialidade celeste, através do nascimento de Cristo da Virgem Imaculada Sophia, que alimenta o recém ungido com o conhecimento de Deus (o Pão da Vida), e com a Sabedoria Divina (a Água Viva). Daí em diante, as exigências para o novo agraciado serão maiores, e, além disso, compete-lhe distribuir gratuitamente o Pão da Vida e a Água Viva, aos que têm fome e sede da Justiça e da Verdade, que também devem estar incluídos entre os eleitos para recebê-los.

O Ser Humano, convertido no Santuário, ou Templo Vivo do Espírito Santo, está credenciado a falar sobre os mistérios de Deus, pois reconhecendo em si a presença da Luz Divina, ele não necessita do poder dos seus argumentos lógicos constantes do seu raciocínio, tampouco de interpretações literais das Escrituras. que jamais poderão alcançar a integridade do espírito. O simples conhecimento mecânico da Bíblia, sem a presença do Espírito que inspirou e ensinou os escolhidos que escreveram os livros que a compõem, não é suficiente para a compreensão do seu sentido essencial, que somente é acessível através do mesmo Espírito que direcionou aqueles escritores. Quanto aos agraciados com o acesso aos mistérios Divinos, também a sua mente é capacitada para expressá-los, para que os talentos recebidos não sejam enterrados, tornando-se infrutíferos e inúteis.

A compreensão mais profunda, portanto, está no Espírito de Deus, que o Verbo ou Jesus Cristo no interior do espírito humano, a partir do momento em que a Luz brilhou no seu Coração, e o Filho de Deus se fez o Filho do Homem, mostra-se na eclosão do novo nascimento. Boehme não pretende afastar as pessoas do interesse para conhecer a substância da Palavra, mas sim esclarecer que não é uma simples fé histórica, mas sim, é a fé viva que conduz a Jesus Cristo. Assim, todo ensinamento que não vier do Espírito Santo, não passa da leitura do sentido literal dos textos bíblicos, com a interpretação racional do seu conteúdo, pois o Pregador ou suposto Mestre, não está investido do poder de Cristo, expresso pelo Espírito Santo, que age no interior dos que ensinam e no interior dos que ouvem, para que seja possível ocorrer a transmutação do efetivo conhecimento de Deus. O ensinamento de Boehme se identifica com o conteúdo das Escrituras, e Isso pode ser compreendido com bastante facilidade, mediante o exame de I Coríntios 2;4 a 16 / I João 2;26, 27 / Hebreus 5;4.

O Ser Humano nasce das essências que foram contaminadas pela insubordinação do Anjo de Luz decaído, que tentou extrapolar os limites dos domínios que lhe haviam sido determinados (Judas 1;6) com a intenção de ampliar a sua expansão e até unificar as manifestações, para subjugar o próprio Manifestante. Todo o enorme conjunto dessas essências contaminadas, incluindo o Anjo rebelde e suas legiões, foi, pelo poder de Deus, confinado no grande espaço que Boehme chama de Terceiro Princípio, onde está incluso o nosso Sistema Solar e a Via Láctea, assim como todas as galáxias. A finalidade é a regeneração da matéria contaminada, mas a onisciência de Deus sabe, por antecipação que será regenerado apenas um terço (33,3%), sendo dois terços (66,6%) irrecuperáveis.

Com efeito, nós os Seres Humanos somos tri polares, em função da nossa contaminação, onde a nossa composição essencial é de um terço bom, (o Bem); um terço neutro, (a nossa Natureza); e um terço ruim (o Mal). No decurso do processo regenerativo, todos nos definiremos por um desses atributos, sendo que o terço neutro e o terço ruim se fundirão em um, somando dois terços (66,6%). Os estudiosos da Bíblia conhecem muito bem a história das duas Bestas. (Apocalipse 13;1,11,12,18)

Resta-nos a curiosidade quanto ao nosso destino final. Nesse sentido, lembremo-nos do químico francês A. L. Lavoisier (1743-1794) e da sua incontestável descoberta: “Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. Então, seremos objetivos. De tudo o que existe no Terceiro Princípio, (inclusive nós os Seres Humanos), 33,3% será regenerado e reintegrado ao Reino de Luz, onde se tornarão corpos substanciais com as características angelicais, e 66,6% serão dissolvidos nas Trevas, no tempestuoso tormento das duas forças contrapostas, entre a adstringência da atração, o amargor da expansão, a angústia e o calor gerado pelo confronto entre convergência e divergência, cuja dissolvência é como a de um copo d¹água despejado no oceano. Resumo: 33,3%=Luz e 66,6%=Trevas.

Para facilitar a melhor compreensão do parágrafo acima, é necessário estudar a Bíblia, na ordem: Hebreus 11;3 / Isaías 45;7 / II Coríntios 4;6 / Daniel 12;3,4 / Mateus 13;43 / Sabedoria 3;7 / Filipenses 3;20,21 / Isaías 34;4 / Efésios 5;8,9 / II Pedro 3;10,11,12 / Zacarias 13;8,9.

Com respeito à compreensão do Mistério Magno (Boehme), e isto significa penetrar no núcleo das profundezas de Deus, Boehme se expressa por similitude, todavia, com grande aproximação, para a percepção dos privilegiados portadores da unção espiritual. Ei-la: “O Fogo, a Luz e o Ar surgem da vela acesa, mas a própria vela não é nenhum dos três, senão a causa deles”. A Unidade Eterna, como a vela, é a causa e o Fundamento da Trindade Eterna, manifestada a partir da Unidade, que se mantém integrada à Trindade, pois Ela, antes oculta, se revela na associação Trina, gerando de Si mesma, que é a Antítese ou o Não Fundamento, a Tese, que é o Fundamento, os quais, em conjunto, geram a Síntese, que é a conciliação ou harmonização da Antítese e da Tese, estabelecendo a Tríplice e Indissolúvel Aliança Eterna, que se expõe no Universo revelado.

Podemos então, sincronizar o alento “teo-filosófico” de G. W. F. Hegel (1770-1831) com o alento teosófico de J. Boehme (1575-1624). Assim, Antítese é a Força Centrípeta, (o Pai) que se volta para Si mesmo, na eterna Atração do abraço adstringente, gerando em sua própria contraposição a Tese, que é a Força Centrífuga, na eterna Expansão, nos braços abertos em “V” (o Filho), que expande ou difunde as manifestações eternas da Vontade do Pai. A extrema tensão entre a Atração convergente e a Expansão divergente, produz em conjunto, a Síntese, na Força Rotativa, (o Espírito Santo) que envolve a Atração e a Expansão e estabelece a eterna Rotação, zera a oposição entre a convergência e a divergência, tornando-as harmoniosas e totalmente Conciliadas, com o equilíbrio absoluto entre a Atração e a Expansão, indicando-nos que o Universo é rigorosamente estático, mas pleno de movimentos ininterruptos em todas as suas estruturas, cuja Rotação contínua opera na configuração substancial das manifestações da Vontade, e o resultado é o Universo, revelado no deslumbrante Carrossel esférico envolto no Arco-Íris do Senhor, rodopiando infinitamente dentro de Si mesmo, que é Tudo! (Verificar nossa ilustração na página nº 67 do livro “Caminho Para o Tudo”)

A Theosophia de Boehme, para facilitar a compreensão, descreve o Universo como constituído de três enormes divisões, estabelecidas em três Princípios, que intitularam o seu livro “Os Três Princípios da Essência Divina”. O Primeiro Princípio é o Reino absoluto e exclusivo do Pai, a esfera maior totalmente permeada pela Força Centrípeta, introflexa, poderosamente atraente e voltada para dentro de Si mesma, onde há uma inteligência única, plena e totalmente imperceptível. Ali estão as Trevas insondáveis onde o nosso pobre intelecto se detém. O Segundo Princípio é o Reino do Filho, o Reino Angelical da Luz, com os Príncipes Angélicos, os Querubins e as Incontáveis Legiões Angelicais. O Terceiro Princípio é uma extrageração, derivada do Segundo Princípio, estabelecida abruptamente, apenas para o confinamento temporário, de toda a matéria contaminada pelo Príncipe Angélico rebelde, Lúcifer, ora transformado numa arena, onde o Espírito Angelical, o Espírito Astral e o Espírito Infernal travam, no curso da Geração Cósmica, uma grande batalha para assumir o Reinado absoluto, cuja batalha se estende aos Seres Humanos, que também abrigam os três poderosos Lutadores, postados em todas as essências ou componentes do Terceiro Princípio, todos com as suas próprias e individuais características. O Primeiro e Segundo Princípios são eternos, sem início e sem fim, e o Terceiro Princípio começa e termina a cada Geração Cósmica, que se renova infinitamente, porém, sempre com novos componentes, todos eles, e também com novos “atores e atrizes” coadjuvantes.

Para que possamos avançar na percepção destes eventos, devemos admitir o determinismo absoluto, onde não existe o aleatório, portanto, nenhuma novidade sobre o que quer que seja. O Terceiro Princípio é um filme chamado Geração Cósmica, que se repete infinitamente, sempre com os mesmos cenários, o mesmo enredo e o mesmo roteiro, porém com novos integrantes no seu elenco de atores e atrizes, os quais desempenharão sempre os mesmos papeis, na mesma história; ou seja, serão os nossos “avatares”, mas sem nenhum resquício de reminiscências efetivas, senão vislumbres sutis, que poderão se ampliar com a eclosão de transcendentes revelações espirituais. O mundo da Vontade Inteligível (das Idéias) no Primeiro Princípio; o mundo Espiritual Angélico com as idéias manifestadas no Segundo Princípio; o mundo Sensível (das Imagens ou Sombras) como manifestações temporárias, conforme a percepção de Platão, o grande Filósofo original, com os devidos acréscimos.

Como diz Boehme: “O espírito do Ser Humano não veio sem sentido, pois das estrelas e dos elementos, ele traz em si, oculta, uma centelha da Luz e do Poder de Deus. Por isso, Ele disse (Gênesis 1;26: Façamos o ser humano à nossa imagem e segundo nossa semelhança”). Compete-nos ativar essa centelha, transformando-a no fogo ardente, ávido para alcançar a nossa reintegração essencial, às mesmas condições que desfrutávamos desde antes da fundação do nosso mundo. Vamos concentrar nossas ações e nossas expectativas, para que a metamorfose ou transformação definitiva e irreversível seja para a Luz e não para as Trevas! Feliz jornada a todos!