Um velho álbum
 
Como se fosse um velho álbum com velhas fotos, a cada de minhas noites insones, folheio e reviro minhas mais recônditas lembranças em busca de me encontrar, debalde. Perscruto meu passado, meu presente e até mesmo meu futuro em busca de um sinal que nunca encontro.

Caminho pelas ruas de minha velha cidade, mas, gozado, é como se o tempo não tivesse passado, ainda é a mesma de há muitas décadas, com seus casarios de que conhecia cada parede, cada tijolo, cada portal, onde ainda ecoam os sons próprios e particulares de seus habitantes, em cada quintal, com seus cheiros, seus pomares de onde roubei frutas algumas vezes, onde certamente aprontei algumas das tantas que sempre aprontei, menino levado, como se dizia.

Reencontro amigos que já se foram para outros mundos ou que agora se encontram distantes, chegando a ouvir de novo o som de suas vozes que retinem em meu cérebro, ao reviver os tantos momentos com eles desfrutados e vividos, nesses doces tempos de nossas infâncias e juventudes, a me convidarem para participar de mais uma traquinagem, algumas inocentes como jogar pião, bolas de gude, brincarmos de pique esconde, bota, carniça, outras nem tanto.

Sento-me de novo nos bancos dos jardins da praça, mas não a sinto ou vejo como a atual, insípida, sem cor, sem cheiros, sem histórias, sem as árvores que a compunham, somente a Velha Senhora permanece, a cada dia mais pujante, lembrando-me que não é fruto de um sonho, que é realidade, que sempre existiu e existirá, talvez até muitas décadas depois que eu também me for, mantendo indeléveis as marcas de meu canivete que a tatuou com corações entrelaçados e as iniciais desse amor hoje tão longínquo, tão mais que minha própria existência.

Ah, esses doces amores que se desvaneceram no ar, como se cometas em céu límpido de luas cheias, que o cortaram de norte a sul deixando seus rastros expressos por alguns instantes, mas mantendo-se tatuados como se a fogo para sempre em meu peito, em meu ser, no pouco e no tudo que sou. Entre lágrimas de mais pura saudade os rememoro, saboreando cada carinho, cada beijo, cada afago, cada jura trocada, cada momento desfrutado, mesmo sabendo que não seria eternizado, hoje vejo.

E divago pela efemeridade da própria vida, que não preserva esses momentos tão especiais que cada um de nós vivemos, somente guardados por breve período em nossas lembranças e nas de alguns outros e que vão sendo cobertas aos poucos pela poeira do tempo, até que desapareçam, como se nunca tivessem existido.
LHMignone
Enviado por LHMignone em 11/08/2016
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