Minha Mesa de Trabalho

Sentei-me à mesa de trabalho e indaguei-me: por onde vou começar?

Olhei e vi que ela estava atulhada de papeis, livros e outros objetos. Fiquei um tempo assim admirando aquela bagunça, sem saber exatamente o que fazer, quando o telefone tocou, tirando-me daquele momento contemplativo.

No curso da conversa telefônica precisei fazer uma anotação, mas não conseguia encontrar uma caneta ou um lápis, de modo que pedi socorro à secretária, que já veio portando a caneta e o papel, pois bem me conhece.

Ela olhou para a mesa e em seguida para mim, sem nada dizer, mas pelo o olhar notava-se a desaprovação pela evidente desorganização reinante.

Pressionando os papeis soltos sobre a mesa, levantando uma pasta aqui, outra ali, folheando-as, encontrou quatro canetas e dois lápis, os colocando no local adequado, olhando-me, novamente, com aquele ar de censura estampado em seu rosto.

Argumentei que minha mesa assim se encontrava, porque uma mesa de trabalho deve conter tudo o que se precisa para o ofício e que assim eu nela me sentia bem.

Ela nada disse, mas tenho certeza que pensou: sim, mas poderia estar organizada.

Então resolvi demonstrar para ela que eu sabia o que tinha sobre a mesa e conseguia localizar, com alguma precisão, quase tudo.

Levantei-me, sentei-me na poltrona defronte e pedi-lhe:

- Por favor, pegue para mim, no seu lado direito, a pasta de “fulano de tal”.

- Agora, ao centro, no meio desses papeis, há uma anotação sobre uma sustentação oral que farei amanhã, traga-a também.

E assim fui indicando diversos anotações em pedaços de papel, contas a pagar, convites e objetos, com tal precisão que eu mesmo me surpreendi.

Antes que ela se retirasse, perguntei-lhe se gostava de poesia e, sem aguardar a resposta indiquei-lhe o local de uma folha impressa contendo o poema “Casa Arrumada”, de Carlos Drummond de Andrade, para que lesse. E acrescentei que aquele poema bem retratava o meu sentimento em relação à minha mesa de trabalho.

Ao fim do dia ela retornou para agradecer. Se entendeu o recado, não sei.

Hegler Horta
Enviado por Hegler Horta em 22/11/2016
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