Tio Arnaldo em duas passagens

Para o tio Geraldo, que me vê do infinito e poderia ter protagonizado estas passagens.

Tio Arnaldo era homem bem-falante, desses que aprenderam com a vida e não escondia a sabedoria na dicção límpida, audível, que ficava muito bonita no tête-à-tête e ao telefone. Tinha lá os seus sestros de elocução, como a mania de dizer "ótimo", "ótimo". Era uma espécie de muleta linguística, que deixou tia Lívia chateada quando lhe telefonou para informar que vovô Sávio, pai de ambos, não estava nada bem. Do outro lado da linha, ouviu-se aquele "ótimo", "ótimo".

– Como, Naldinho, papai está indo embora?!

O tio deu-se conta e corrigiu-se, com o jargão das atas, que costumava ler e escrever:

- Digo, digo, péssimo!, péssimo!

Certa feita, tio Arnaldo viajava lá pelas cercanias de Caratinga com os filhos, ainda pequenos, e a tia Darcy, que nos premiava a todos com sua delicadeza. O tio não era tão bom ao volante quanto nas falas eloquentes. Entrou mal em uma curva e bateu em um barranco com a Rural Willys – fruto de muita telegrafia. Sem ferimentos sequer leves, saem todos do veículo, e a tia desabafou para o marido, que contemplava a frente do automóvel, toda amassada:

- Que sorte, Naldinho! Todos vivos, sem ferimentos!

A resposta, alto e bom som, veio num átimo:

- Ótimo! Ótimo!

E refletindo:

- Sorte nada, mulher! O azar é que não foi completo!