Fumaça do amor

“Segundo moradores, ninguém lá precisa de receita para sentir os efeitos do medicamento contra disfunção erétil. À imprensa britânica, eles garantem estar sempre sob influência da “fumaça do amor” expelida pela fábrica. (…) “Basta um cheiro e você fica rígido”, disse a bartender Debbie O’Grady”. (O Globo)

30 anos depois que a fábrica de viagra havia chegado àquela pequena e pacata vila irlandesa, se tornou possível chegar a uma peculiar conclusão: não era só a vida dos moradores que havia mudado, a forma de amar também.

E aqui não se fala apenas do amor físico, vulgo carnal, mas também da forma de demonstrar carinho, dos sentimentos mesmo. Nem um “eu te amo” era mais a mesma coisa.

Mas se engana quem pensa que isso foi uma coisa ruim. Muito pelo contrário, pelo menos para uma metade da população. Com a fumaça do viagra circulando livremente pelo vilarejo, os homens não conseguem mais esconder os sentimentos, não importa o quanto tentem.

É claro que eles conseguiram aprender a viver suficientemente imunes, de forma que não passam 24 horas por dia com uma ereção. Mas é só avisar a moça amada, que a fumaça termina o trabalho. Se é que vocês me entendem.

Para as mulheres, a tarefa ainda é mais fácil já que os efeitos do “viagra gasoso” não afeta elas — pelo menos não tão visivelmente — quanto afeta os marmanjos. Se é que vocês me entendem novamente.

Mas isso nem importa. 30 anos depois, as pessoas aprenderam que muito melhor que amar escondido é amar livremente. Falar, contar, confessar, sem ter que esperar que o ser amado descubra ou que a fumaça da fábrica cause um constrangimento facilmente evitável, manifestando o amor primeiro pela boca e antes pelo órgão sexual — mesmo que os dois possam se unir eventualmente.

Os irlandeses daquela pequena vila agora amam de outra maneira e isso influencia na forma como vivem — e não o contrário. Há quem diga que a falta de amarras no amor tenha até influenciado na expectativa de vida da população, que só aumenta. As crianças nascem mais bonitas, a taxa de divórcio diminui, os casamentos duram mais…

As consequências são várias e nos mais diversos âmbitos. Pesquisadores de todo o globo estudam passar um tempo no local para estudar um pouco mais o novo modo de vida daquele interior irlandês — até porque os efeitos da fumaça do viagra já foram devidamente estudados há tempos.

E esse talvez seja o melhor momento para isso. Com a queda nas vendas de viagra (a fumaça é de graça!), a fábrica anunciou o fechamento há poucas semanas. Donalds e Liams cantam músicas nas esquinas sobre os tempos negros que estão por vir.

Talvez amanhã seja tarde demais para estudar a felicidade que se instaurou na vila com a mudança na forma de amar. Porque, verdade seja dita, os irlandeses nunca estiveram tão pra baixo. Sem trocadilhos.

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