FILHOS CABISBAIXAM NOSSO PANO DE CHÃO

Filhos levam nosso sangue, nosso mangue, nossa folia. São imãs dos nossos respiros, dos nossos transpiros, das nossas alegorias. Filhos respingam nossos suores, nossos acordes, nossa paixão. Filhos desmatam nosso medos, nossos folguedos, nossa razão. Filhos são trecos do nosso chão, do nosso porão, da nossa jugular. Filhos desparafusam nossos risos, nossos sisos, nossa rendição. Filhos repovoam nossa solidão, nossa encarnação, nosso estopim. Filhos dissipam nossas fuligens, nossas vertigens, nosso pão. Filhos sugam nosso começo, nosso esqueço, nossa vazão. Filhos são abraços ocos, devaneios toscos, ondas mancas. Filhos escorrem de nós, correm de nós, ressuscitam de nós. Filhos psicografam nossos vilões, nossos arpões, nossa fé. Filhos são cheiros murados, artelhos surrados, gozos alados. Filhos sabem dos nossos assuntos, dos nossos defuntos, da nossa comichão. Filhos rompem nossos pecados, nossos legados, nosso poente. Filhos entendem nossas fronhas, nossas bronhas, nosso perdão. Filhos berram nossos desmanches, nossas avalanches, nossa cruz. Filhos requentam nossas paisagens, nossas miragens, nosso amanhã. Filhos são alucinações, reinações, sossegos. Filhos fazem tudo valer. tudo feder, tudo ruir. Filhos acalentam, amamentam, apaziguam. Filhos têm o cheiro da luz, do pus, da cicatriz. Filhos são feras desconhecidas, desmedidas, libertadas. Filhos alforriam nossas caçadas, nossas entoadas, nosso réquiem. Filhos sacodem nossos poleiros, nossos viveiros, nossa varanda. Filhos são benditos, são malditos, são ungidos. Filhos enebriam as dores, as cores, os coronéis. Filhos são começo, são estremeço, são porão. Filhos sabem das nossas verdades, das nossas amenidades, dos nossos pântanos. Filhos arrematam anseios, arrematam arreios, arrematam cabrestos. Filhos são gostos puídos, gostos desmedidos, gostos tardios. Filhos têm o tempero dos nossos encardidos, dos nossos ardidos, das nossas ciladas. Filhos reaquecem nosso passado, nosso fiado, nossa voz. Filhos são a desculpa que desacatamos, que embalamos, que amamentamos. Filhos nos levam à farra, à surra, à curra. Filhos são tinturas de Deus, suores de Deus, gingas de Deus. Filhos sabem o que defendemos, o que entretemos, o que renegamos. Filhos aportam nossos pesares, nossos azares, nossa gaguice. Filhos cabisbaixam nossas alegorias, nossas estrepolias, nossos panos de chão. Filhos sabem o que fecundamos, o que defecamos, o que enterramos. Filhos são nosso mais robusto grito, nosso mais robusto véu, nossa mais robusta vitória. Filhos valem a pena, são a pena, são que pena. Filhos queremos ter mais, queremos nos quintais, queremos nos temporais. Filhos até sempre, até nunca, até vai saber.

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Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 09/02/2018
Reeditado em 09/02/2018
Código do texto: T6249134
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