_________________A Dor na Pele


 
A notícia veiculada na imprensa é realmente revoltante: na cidade de Araporã, a 125 quilômetros de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, a mãe de duas alunas, em áudio no whatsapp, despeja seu asqueroso discurso de ódio contra as professoras das filhas, dizendo não aceitá-las por serem negras. Na gravação, ela diz à antiga professora das meninas, que foi à Escola protestar contra Vanilda Batista e Roberta Renout, e as coisas que diz sobre elas são de estarrecer qualquer pessoa com o mínimo de princípios de humanidade. Não deu outra: a chocante manifestação de racismo explícito viralizou nas redes sociais e tomou proporções de alcance nacional.

Os áudios gravados por Luciana Faria Diniz, a acusada do crime, chegam a ser repugnantes: são palavras duras, impactantes, de puro deboche e cinismo que ferem como navalha. O racismo e o preconceito têm sido temas de muitos debates sociais e com frequência são abordados nos folhetins da TV. Mas nem tudo é ficção: a atriz Eliane Giardini, recentemente, confessou que chorou muito após gravar cenas de O Outro Lado do Paraíso, em que incorpora uma mulher arrogante e preconceituosa, que contracena com uma negra, advinda de um quilombo, personagem vivida por Erika Januza. Giardini afirma ter se sentido mal ao ter que atuar humilhando sua colega de trabalho durante a gravação. Não é pra menos. E se até no faz de conta dói, imagine na vida real!

Vive-se sim, tempos de ódio. De um ódio irracional que não se explica por mais que se busque explicação. O racismo é mesmo esta grande e permanente ferida presente na sociedade, e, apesar de todos os esforços empreendidos em seu combate, continua aberta e sangrando: todos os dias se tem notícias de crimes desta natureza, e embora se afirme que vêm diminuindo, na prática, sabe-se, ainda acontecem —mesmo de forma velada —  com uma frequência assustadora.

 Como compreender o íntimo de quem profere palavras tão terríveis sobre o próprio semelhante? O que teria Luciana Faria Diniz contra as duas professoras, quando se referiu a elas com tamanho ódio e desprezo? Nada — a não ser o fato de que são negras, pois foi esta sua única queixa quando disparou sua barbárie vocabular de teor tão repulsivo. O ato fortemente repudiado pela cidade de Araporã, pela própria Diretora da Escola e pelas Redes Sociais, é de uma crueldade inimaginável, caso psiquiátrico a ser estudado, pois custa crer que alguém possa pensar, falar e agir de forma similar sem sofrer de algum transtorno mental. Se este for um caso considerado normal, então o mundo é mesmo assustador, um lugar perigosíssimo pra se viver.

Em Araporã seguem as investigações policiais. Tomara que as coisas não se acomodem e fiquem só no barulhão. Luciana precisa sim, pagar por todo o mal que causou. Após a repercussão do fato, ela diz ter se arrependido, justificando cabeça quente. Arrepender-se é pouco. Além de retratar-se publicamente, há que ser devidamente penalizada. Talvez nem haja pena que repare mal de tamanha grandeza, mas deixar passar em branco é compactuar para que crimes semelhantes continuem a ocorrer, deixando rastros de dor e sofrimento.

O que poderá reverter as lágrimas de Vanilda Batista e Roberta Renout? Nada que se faça será suficiente, mas o crime requer, certamente, uma postura rígida da lei. Afora as penalidades cabíveis, as sequelas são de prejuízo incalculável: consta que uma das filhas também aparece no áudio validando os conceitos e preconceitos da mãe. Era de se esperar outra coisa? Claro que não. Crianças aprendem por modelos. E quando o modelo é da qualidade de uma Luciana Faria Diniz, compreende-se porque o desrespeito para com nossos iguais nunca tem fim: é um mal que lastra de pai pra filho, neste caso, de mãe pras filhas. Lamentável!